A Trocal 2
Visito mamãe e, na despedida, ela vai me levar no portão de sua casa. Aqui no interior de Minas Gerais ainda temos esse costume. Acho que é um bom costume, porque a visita sente-se muito importante! Então, nesses dias chuvosos, nossos olhos sempre conferem o tempo no céu. Ao olhar para cima, vejo a futura mamãe chocando seus ovos no ninho. A trocal construiu seu ninho no emaranhado dos fios do poste de energia elétrica. Se é que podemos chamar isso de ninho. Oh, meu Deus, como é desmazelada! O ninho parece ter sido feito de qualquer jeito, apenas tendo depositado uns raminhos secos na trama de fios de alta tensão. Não se preocupou em tomar sol escaldante ou chuvas torrenciais. Não há um tiquinho assim de sombra para os dias quentes de verão... e lá estava ela, curiosa com o movimento que fazíamos em baixo dela. Resolvi tirar fotos e ela me pareceu tímida, se escondia, até que consegui uma boa, após imitar seu canto, que amo, amo, amo... Alguns o consideram melancólico e até agourento, mas eu adoro esse som. Transporta-me à calmaria da fazenda, ao sossego... Por falar nisso, papai contou-me que a trocal era o pássaro mais arredio e desconfiado de todas as aves da fazenda. Na sua época de criança, era comum brincadeiras que envolviam moleques, estilingue, pedras, passarinhos e morte. De todas as aves, a prenda maior era a trocal, por ser mais difícil alvejá-la. Faziam arapucas para torná-la um alvo possível de acertar. Hoje mesmo, antes de sair à porta, ele contou-me esse caso, espantado que estava de ver uma pousar na área pegada à cozinha de sua casa e andar por ali, despreocupada. O mundo está mesmo de cabeça para baixo!