## SEGUIR SEM OLHAR PARA TRÁS?##

Seguir sim, não olhar para trás é devaneio.

Olho e volto sempre que desejo deixar a mente degustar algum detalhe que foi gostoso de viver. Revivo, sorrio durante o passeio, sinto novamente os gostos, os cheiros dos perfumes que usei e até dos momentos. Isso mesmo, os momentos tem gosto e cheiro. Vez por outra sinto, assim, do nada, um cheiro do passado. Às vezes tão nítido que chega a dar frio na barriga.

Já escrevi algum dia sobre isso. Sou saudosista mesmo, dessas que tem saudade de tudo, até de ontem. E amanhã terei de hoje. Já ouvi tantas pessoas repetirem com veemência que quem vive de passado é museu. Acho graça, pois apenas não assumem que sentem, que voltam, que saboreiam, que se arrependem de algumas coisas. E se não fossem os museus das nossas mentes...

Ah, que vazio seria uma vida sem história, sem ter do que lembrar. Algumas lembranças são pesadas, mas hoje podem ser lembradas sem dores, apesar das dores que marcaram.

Lembro da menina tão jovem, atropelada por um ônibus que subiu na calçada enquanto ela esperava para atravessar. As amigas escaparam, e ela, sonhadora e apaixonada, olhava para o outro lado, talvez pensando no namorado que, eu vi, acabara de beijar no colégio. Era um belo casal. Qual teria sido seu último pensamento? Morreu que nem sentiu! Morreu amando. Ela era tão linda. Eu, mais jovem, pensava em ser igual a ela quando crescesse. Cresci, não fiquei igual a ela, e ela se foi com tão pouco passado para lembrar.

A vida é assim, às vezes nos escapa e às vezes escapamos por um triz, como eu, que aos três anos fui jogada pela janela do carro e não morri.

Dia desses fiz que esqueci a sandália na beira do mar, só para voltar e passar o rabo de olho para aquele alguém que não volta, mas que está lá, sabendo que vou voltar e colocando a música do Bee Gees alta no som do carro para chamar minha atenção. Por onde andará, senão nesses caminhos largos do passado?

Sigo, volto, sigo, voltarei. Meu tempo linear eu comando, pelo menos até o hoje. Com certeza em breve voltarei ao 22 de janeiro de 2020 e lembrarei de vocês, com o carinho de quem só esquece o que não marcou.

(Taciana Valença)

TACIANA VALENÇA
Enviado por TACIANA VALENÇA em 22/01/2020
Reeditado em 22/01/2020
Código do texto: T6847939
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