SUPERAÇÃO
Os olhos brilharam já ao amanhecer. Aquele dia prometia muita emoção e a certeza de dever cumprido.
Levantou-se tranquilamente com o coração palpitando. Já havia aprendido a controlar a ansiedade mas naquele dia estava difícil. Tomou um banho para relaxar e encaminhou-se para o café da manhã. Cumprimentou a todos educadamente deixando transparecer no semblante a alegria daquele dia. Era um sorriso diferente, vitorioso, contagiante.
Tomou um bom café pensando nos anos anteriores. Desde quando iniciou sua trajetória pelo mundo do futebol juntamente com seu irmão, seu melhor amigo. Lembrou-se da infância que tiveram jogando bola pela casa, quebrando as flores da casa de sua avó ou abalando os azulejos da parede da casa de seu avô.
Lembrou-se das broncas que levavam quando chutavam a bola no meio da casa, por entre as pernas de sua mãe. Um sorriso peralta soltou de seus lábios. Sim, foi um tempo bom.
Lembrou-se, ainda de sua insistência para encontrar uma forma de jogar bola. Um teste, um olhar de procura. Os dias que ia para a Baixada para bater bola junto com seu pai e seu irmão, ou mesmo sozinho.
Lembrou-se do apoio de seu pai. De quantas vezes o pai deixava seus afazeres para acompanhá-los nos treinos e nos jogos. Da dedicação total a um sonho dos filhos. Da mãe que sempre apoiou. Em todos os momentos sempre presente, persistente, orante.
Lembrou-se, por mais um instante, dos testes dos quais havia participado. Lembrou dos "nãos" que recebera e de tentativas fracassadas. Mas lembrou-se também das pequenas vitórias. Tijolos construídos ao logo da adolescência e da juventude. Percebeu o quanto havia crescido, amadurecido, tornado-se um combatente sem medo de desafios ou quedas.
Sim, hoje era um dia especial. Momento de comemorar esta vitória diante dos inúmeros desafios que enfrentara.
Passou o restante do dia na expectativa do jogo. Era uma segunda-feira. Ligou para a esposa, para os pais, para o irmão. Almoçou. Assistiu a programas de televisão, acessou a internet. Sempre com o coração agitado, o pensamento a mil.
Chegou a hora. O momento mais esperado. Quando vestiu o manto verde e preto com o número 100 seu coração respondeu com uma breve oração interna. Intensa. Proferida de seus lábios em forma de ação de graças. Sim, a ele toda a honra e toda a glória.
Entrou em campo sorrindo, sonhando, agradecendo, vivendo aquela história com a leveza da alegria do momento. Jogou os noventa minutos no mais alto grau de concentração.
A equipe venceu. Ele venceu.
A alegria do instante transformou-se em história a ser contada a seus descendentes. Compartilhada com seus familiares. Dividida com sua fé, sua esperança, sua confiança naquele que transcende o antes, o agora e o depois. O dono da vida: Deus. Seu sustento e fortaleza.
Sorriu novamente. Internamente. Era bom sentir-se abençoado.