Segurança e saúde
Hoje ouvi uma notícia de que o presidente Bolsonaro e seu ministro da economia exigem celeridade nas modificações das normas de segurança e saúde ocupacional. E o que eu tenho com isso?
É que por mais que queira dizer “tô nem ai”, tenho uma galera jovem da minha grande família no mercado de trabalho e o povo, pelo jeito, não quer parar de reproduzir. Além disso, tenho uma certa experiência de vida que me deixa muito preocupada com a notícia.
Meu pai se aposentou por invalidez, lá na década de 70 do século passado, devido a um enfisema pulmonar. Quando a doença avançou ele ficou, literalmente, ligado a uma máquina de oxigênio. Certo dia, quando fui visita-lo ele me disse: “ah filha, não sei porque estou sofrendo tanto”. Respondi brincando, que ele devia ter matado muito passarinho quando pequeno, mas depois tentei fazer uma retrospectiva de vida com ele.
Além dos percalços de ser de uma família humilde, meu velho pai trabalhou nas minas de carvão de Criciúma; foi foguista da Maria fumaça que transportava o carvão; eletricista (que lhe causou uma cicatriz na cabeça devido a queda de um poste); pedreiro e mestre de obras, sentindo na pele as intempéries do tempo. Perguntem se naquela época se falava em segurança do trabalho e saúde ocupacional? Claro que não.
No período que meu pai ficou aposentado, fui exercer meus conhecimentos de rh no Centro de Construção de Subestações(CCS) da CEEE, ou seja, sai da pura burocracia do RH administrativo e fui parar no meio dos colegas que pegavam no pesado, que passavam semanas longe de suas famílias, que voltavam cansados e com sacolas de roupas e botinas sujas, resultantes do trabalho braçal. Ali comecei a conhecer um pouco dos Equipamentos de Proteção Individual (EPI) e a ter contato com as normas reguladoras dos processos de trabalho (NR’s, ABNT, legislação...).
Depois fui trabalhar no treinamento de pessoal e, vejam só, fiquei responsável pelo aperfeiçoamento de técnicos e formação de eletricistas. Daí tive que aumentar, e muito, meus conhecimentos de tudo o que regulamenta o passo a passo para uma pessoa executar a tarefa, que nos proporciona acionar o interruptor e magicamente acender uma lâmpada. Ainda bem que quando fui admitida na CEEE, em 1975, já existia o setor responsável pela Segurança e Saúde Ocupacional. Minha empresa sempre foi preocupada com segurança e saúde.
Mas mesmo com todo aparato técnico a questão “segurança do trabalho” , por vezes, resultava em dores de cabeça. Não vou falar aqui dos problemas administrativos, mas sim daqueles que envolvem a responsabilidade e o comprometimento. Sim, a segurança no trabalho é de responsabilidade da empresa, em proporcionar todas condições necessárias e do comprometimento do empregado em cumprir o estabelecido.
E as NR’s, ABNT e legislações? Ora, são de responsabilidade do estado, porque é o estado que deve se preocupar com o trabalhador, com o povo, até porque trabalhador acidentado ou aposentado por invalidez não é bom pra lado nenhum. Claro que concordo com revisões, atualizações e melhorias de normas e legislações. Não sou tão tacanha assim, mas penso que se o estado estivesse presente nas questões de segurança do trabalho lá na época do meu pai, provavelmente ele teria tido mais tempo de vida. Mas as alterações não devem, não podem ser feitas em gabinetes.
Com todas as normas reguladoras e legislação existentes, nosso país apresenta os dados de “... 2.700 mortes por ano, mais de 82 bilhões de gastos previdenciários, apenas os benefícios relacionados a acidentes e doenças ocupacionais...”*
Opa, espera ai. Estamos discutindo a famigerada reforma da previdência, nela está prevista a diminuição de valores referentes a benefícios, incluindo o auxílio acidente, é claro. Então, será que posso pensar que modificando as normas de segurança e saúde ocupacional, diminuindo as responsabilidades das empresas, é claro, estaria o estado ajudando a saúde da previdência?
Não, acho que não. Não acredito que o presidente Bolsonaro e seu ministro da economia pensariam em algo que viesse a prejudicar o trabalhador. Ah, mas o trabalhador pode pensar em fazer um seguro acidente, por sua conta, é claro, afinal a reforma da previdência também já prevê que o empregado faça um plano de previdência privada.
Com tudo isso fico imaginando meus filhos, trabalhadores ativos, e toda galera do mundo do trabalho, bem americanizado. Ganhando altos salários, tendo seguros mil, carro na garagem e casa hipotecada, mas rezando muito para não perder o emprego.
Então lembro de Chaplin e seu “Tempos modernos”, da revolução industrial, das lutas de classe e vejo que o mundo do trabalho realmente é muito complexo. Quem sabe a gente volta aos tempos dos escambos, com as produções individuais. Para com isso Tânia, o que se quer é um mundo liberal, lutas individuais mesmo.
Vamos lá, vida que segue.
*https://www.redebrasilatual.com.br/trabalho/2019/05/mudancas-em-nrs-exigem-participacao-de-trabalhadores-e-empresarios/