PRECONCEITO
Naquele dia ele foi ao serviço de saúde da universidade para se inscrever no programa de atendimento odontológico. Esse serviço atendia tanto aos estudantes como aos funcionários. Então tinha uma lista de espera na qual ele deveria colocar o nome.
Chegando lá, na recepção do Departamento de Saúde, ele parou diante de algumas mulheres vestidas de branco que conversavam sobre muitas coisas, mas nada que tivesse ligação direta com o serviço que desempenhavam ali. Como insistiu em olhar para elas, uma delas perguntou:
— Gostaria de alguma coisa?
— Sim, quero saber como é que eu faço para me inscrever no programa de atendimento odontológico.
— E você é funcionário aqui há quanto tempo?
Essa foi uma pergunta que realmente ele não esperava ouvir. Havia apenas alguns minutos que ele chegara naquele recinto, trocara apenas um ou dois olhares com aquela mulher, e ela, cheia de certeza, já dizia que ele era funcionário daquela universidade. Nem ao menos se deu o trabalho de perguntar se ele era estudante ou funcionário. Observou rapidamente a figura do rapaz, sua roupa, seu calçado, suas feições e, mais que rapidamente, concluiu que ele era funcionário.
Ela estava errada.
Ele chegara até à faculdade com muito esforço e dedicação. Era de família do interior, pobre e negra. Estava cursando o primeiro semestre do curso de História e morava na Residência Estudantil dentro da própria universidade, destinada a estudantes de baixa renda.
Ouvindo aquela pergunta, milhões de coisas lhe passaram na mente em poucos segundos, coisas para dizer àquela mulher, coisas para lhe perguntar, verdades a serem ditas pra ela. “Seria ela algum tipo de vidente que descobre os segredos das pessoas?” “Teria lido em meu rosto a história de minha vida?” “Me conhecia de outro lugar e eu não estava me lembrando dela?” “Há alguma mágica que possa ser feita para se descobrir tudo sobre uma pessoa sem ao menos lhe perguntar algo?” Eram as perguntas que o jovem rapaz fazia a si mesmo. Mas, em todo caso, resolveu calar. Respondeu apenas que não era funcionário, era estudante de História e estava no primeiro semestre.
A mulher, sem mostrar qualquer constrangimento, preencheu a ficha dele, sem, contudo, parar de conversar com suas colegas de trabalho sobre os mais variados assuntos.
Ele, à frente dela, olhou disfarçadamente para seus próprios trajes e calçados, a fim de verificar se estava tão mal vestido, a ponto de não merecer ser considerado um estudante universitário. Estava com uma bermuda jeans que ele mesmo havia tingido, de chinelos rasteiros e uma camiseta bem folgada.
“Não estou tão mal”, pensou ele de si mesmo.
Depois de preenchida a ficha, a mulher disse que quando fosse a vez dele ligaria para a Residência avisando o dia e a hora da consulta. Ele agradeceu e saiu porta a fora sem olhar pra trás.
Em sua mente havia apenas um pensamento: “Cheguei até aqui e não é agora que vou desanimar”.
Então, com passos firmes, seguiu para sua aula de Introdução à Filosofia.