Traços culturais
Aquela mulher, alta, de bonito porte, acompanhava o ritmo da música, gingando, entoando canções... A seu lado o marido, ambos cor de chocolate. A festa espalhava alegria, uma espécie de pós-carnaval, e ela sobressaía pela postura altaneira, pela incansável e serena animação. Nada parecia abalar aquela mulher, que, virada para os músicos, acompanhava-os sorridente.
Aquela senhora me lembrou, de repente, um documentário que vi por acaso na televisão, há pouco tempo. A rainha do Congo, entre outras autoridades, era recebida numa das dependências da Assembleia Legislativa de São Paulo. Prenderam-me os discursos, os trajes, os modos. Tratava-se de uma cerimônia solene, mas, ao mesmo tempo, simples, rica em calor humano. Assisti interessada até o encerramento, quando a rainha se dirigiu à assistência. E, então, surpreendi-me diante da sabedoria, da elegância com que falou a visitante. Comentou ela que alguém lhe perguntou se sentia um tanto da África no Brasil. Ela disse que fez apenas as seguintes observações:
"Reparem na música que vocês fazem! Vejam como vocês dançam! Observem as comidas que vocês comem."
Aquela bela negra que marcava o ritmo com o corpo, com jeitos e trejeitos, me fez ver que a rainha do Congo tinha razão, a herança africana, às vezes desvalorizada, às vezes escamoteada, faz parte integrante e indefectível da nossa rica e miscigenada cultura.