As Três Fronteiras - Foz do Iguaçu
Das três cidades limítrofes das Três Fronteiras, Foz do Iguaçu é, sem dúvida, a mais progressista. Com oitenta e poucos anos de idade, tornou-se importante, inicialmente, devido a dois fatores principais: posição estratégica na fronteira com Paraguai e Argentina e por abrigar em seu território as famosas Cataratas do Iguaçu. Sua ocupação iniciou-se em 1889, com a criação da Colônia Militar.
A exploração turística da região intensificou-se por volta de 1965, com a construção da BR-277, que uniu a cidade ao resto do país. Sofreu outro impulso progressista na década de 70, com a construção da hidrelétrica de Itaipu, que reforçou, ao mesmo tempo, sua classificação de cidade estratégica. Nos anos setenta, por causa de Itaipu, cerca de 100 mil pessoas migraram para a região, razão, evidentemente, de progresso na época e de problemas com a enorme mão-de-obra desocupada e sua descendência, ao término da construção da barragem.
Um novo ciclo econômico iniciou-se nos anos 80, com o comércio de fronteira (o famoso ciclo dos "sacoleiros" no Paraguai), que chegou ao auge em 1994/1995, comércio esse em agonia. Tem hoje cerca de 250 mil habitantes (a quarta cidade do Paraná), que vivem, basicamente, do turismo e da promoção de eventos. Seu comércio é bastante dinâmico e influenciado por essa atividade principal, mas também se volta para atender às necessidades das vizinhas Ciudad del Este, no Paraguai, e Puerto Iguazu, na Argentina. Na primeira, pela escassez de produtos, noutra pela valorização do peso argentino, que torna os preços em Foz bem mais baratos. Para quem não sabe, Foz do Iguaçu é a terceira cidade brasileira mais procurada para o turismo, depois de Salvador e Rio de Janeiro, recebendo cerca de l milhão e 200 mil visitantes por ano.
Sua população mostra nos sobrenomes a predominância da colonização européia. Entre alemães, italianos, poloneses, principalmente, e outros povos do Velho Mundo se constituiu a gente do Sul do Brasil, que migrou para essa região de terra fértil e farta madeira no começo do século XX. Essa gente foi se esparramando pelo Oeste do estado, até atingir as margens do Rio Paraná e, de certa forma, continuar esse avanço migratório em direção aos departamentos (mais ou menos províncias ou estados) do Alto Paraná, Canindeyú e Itapúa, já em território paraguaio.
A população original, como de resto de toda a região das Três Fronteiras, era de índios guaranis, hoje praticamente aculturados ou extintos, que falavam o guarani. Resistem ainda algumas aldeias, onde indivíduos se vêem na triste alternativa: ou se aculturam ou se extinguem, porque, apesar de todas as hipócritas políticas de proteção a minorias, o que se vê mesmo é política do "já que não podemos exterminá-los, vamos isolá-los e deixá-los morrer em paz, eles não constituem nenhum perigo". Coisas do mundo globalizado, que tende a tornar tudo uma imensa monotonia.
Voltemos ao presente e ao microcosmo. Foz do Iguaçu, atualmente, por sua proximidade do "Paraguai da muvuca" (lembrem-se das crônicas anteriores, onde falo do "outro Paraguai"), é confundida com terra de pilantragem, falsificações, contrabando e pirataria. Não poderia deixar de ser. Afinal, está ligada a Ciudad del Este pela Ponte da Amizade e o controle na fronteira, por melhor que tente ser, não consegue evitar a contaminação para o lado brasileiro. Também está hoje entre as cidades mais violentas do Brasil. O movimento dos "sacoleiros", por exemplo, é uma das atrações para os bandidos, pois é muito dinheiro que rola pela redondeza, especialmente na Vila Portes, bairro de Foz que faz realmente a divisa com Ciudad del Este. Há muito roubo nos hotéis e nos ônibus de turismo. Por outro lado, a alta taxa de gente desempregada nos últimos anos, os filhos dos barrageiros que construíram Itaipu e não tiveram para onde ir, vieram aumentar essa onda de gente sem rumo e sem futuro, que vê a modernidade e seus luxos chegando e não pode compartilhar dessas benesses.
Mas Foz tem gente simpática em todos os lados. Para quem vem de Brasília, Belo Horizonte e outras cidades grandes, sempre chama a atenção a gentileza das pessoas no comércio, na rua, prontas a dar uma informação, personalizando as relações comerciais que até nossa Pitangui, interior de Minas, por exemplo, está perdendo. Claro, Foz é uma cidade que ensinou sua população a tratar bem o turista, procedimento que se estende a todas as relações sociais na cidade.
Bem cuidada, comércio vibrante, muito arborizada, tem contrastes interessantes, como enormes prédios residenciais ao lado de terrenos onde apenas uma casa de madeira, das antigas, se conserva como há dezenas de anos. Em sua volta, o Rio Paraná, o Iguaçu e o gigantesco cinturão verde do Parque Nacional do Iguaçu, Patrimônio Natural da Humanidade desde 1986, onde reinam, sem rivais, as maravilhosas Cataratas.
Aqui já fiz amigos. Quando partir, dentro de mais três a quatro anos, sei que levarei saudades. Sina de quem escolheu esse tipo de vida cigana no turbilhão do vago mundo.
(Ciudad del Este, setembro de 2001)