Frente a frente com a morte
Vi a morte de perto há alguns dias.
Não a minha, mas da co-autora das minhas jornadas por essas bandas, minha mãe, Rosalina Silbiger, mas conhecida por Rosa.
Passado o impacto da partida, tendo cumprido certas regras burocráticas de praxe e retomando a rotina original, de vez em quando fico matutando sobre a morte, seu entorno, meandros, cheiros, gostos e texturas.
Apesar de ser verdade inegociável que todos morreremos um dia, quando ficamos frente a frente, nem tudo fica tão lógico e natural assim.
Quando a vi na UTI, beirando o fim, entrei em sintonia cósmica com ela e lhe "disse" que se quisesse partir, que partisse, mas que isso ocorresse em paz, sem dor nem sofrimento, do jeito que fosse melhor pra ela.
Estava me despedindo da minha querida mãe e lhe dando "autorização" pra seguir seu caminho - seja ele qual fosse.
Foram dias difíceis aqueles, desde a internação, pra todos nós que convivíamos com ela e amávamos - do nosso jeito e do jeito dela.
Após aquela conexão mental com a mamãe, meu coração, até então impactado pelas sucessivas notícias pouco animadoras, se apaziguou.
Dei um beijo na sua testa, gesto sem resposta formal por conta do estado de coma. Que pena.
Mas senti uma resposta intraduzível de que a dona Rosa precisava desse "salvo-conduto" do seu filho caçula pra descansar de vez.
Foi bem gostoso aquele momento. Foi mesmo.
Pretendo guardá-lo com carinho e saudade pra sempre.
Depois fui jantar no hospital e voltei pra casa.
Quando foi 1 da madrugada ligaram do hospital pedindo a presença de um familiar pra conversar com o médico.
Nem precisaram dizer qual seria o teor daquela conversa.
Escrever sobre o que aconteceu me ajuda a entender o que se passou e talvez possa vir a ser útil pra alguém que terá que enfrentar uma barra parecida (barra é termo bem antigo, coisa de envelhecente como eu).
Despedir de quem está partindo, do jeito que for possível, ajuda bastante a lidar com o manto da morte com mais serenidade, com mais entendimento.
E com menos dor, dando vazão à uma saudade que, pouco a pouco,
vai se transformando numa doce e preciosa lembrança.
Nada mais do que isso.