Minha gratidão às palavras
Sou eternamente grato às palavras por serem minhas tábuas de salvação.
Nelas pude debruçar meus dilemas, minhas inquietudes, aquelas dores teimosas que ficam encravadas nesse chão chamado de vida.
Consigo pelas palavras mostrar o que de fato sou, o que de fato sinto, o que de fato encalho nos confins dos meus pensamentos.
Sem essas palavras, não passaria de acéfala criatura, com veias ocas e coração apodrecido.
Sem as palavras, certamente me reverteria a um merda cabisbaixo, sem amarras, sem leme, sem combustível regendo os ossos.
As palavras são juízas atentas às falcatruas dos meus gestos, às farsas gritantes que arrebanho como se fossem o útero dos céus.
Sem essas muletas compostas por vogais e consoantes, as cascas que protegem meus domínios virariam lesmas, frugais e repulsivas lesmas.
Faço das palavras meu consolo pelo tanto ainda há percorrer, pelos desvios ciganos que tanto fiz por merecer ao longo dessa vez que nunca deságua.
Sou divinamente fiel e grato às palavras por cederem seu bojo às minhas alucinadas faxinas mentais, aqueles turbilhões de véus, matos e respiros que se fizeram meus dias.
Pelo tanto que delas já suguei, já usurpei, já me fiz dono, contraí uma dívida impagável, que gerações que virão de mim ainda terão muito a quitar - em vão.
Obrigado, palavras, por nunca me abandonarem, por estarem sempre à mercê dos meus caprichos.
Obrigado, palavras, pelos timbres guerreiros com que têm me ungido desde sempre.
Obrigado mesmo, valeu!