Domingo Branco

Um menino morreu em plena manhã de domingo.

(Ele não terá nome aqui, porque já possui muitos fora do papel.)

Depois de jogar bola com os amigos foi para casa fazer a lição.

A mãe lavava as roupas dela e do filho.

O pai fora comprar cigarro há dois anos.

A subida do morro era cansativa. O sol batia em sua cabeça, esquentando os cachos negros.

Então aconteceu.

Um estalo forte.

O cansaço aumentou.

Tentou puxar o ar, que vinha agora pesado, pastoso.

("Parecem fogos, mas não é Ano-Novo")

Chegou na esquina e sentiu algo quente descer pelo seu peito.

Olhou para baixo e viu que era sangue.

Olhou para cima e viu a mãe desesperada, chorando, chorando e gritando.

"Foi bala perdida?" ouviu dizerem ao longe. Tudo agora vem de longe. Tudo é longe. Tudo é Branco Pálido.

Uma multidão se acercava, como acontece em toda tragédia.

"Confundiram com traficante!"

"Como puderam confundir ele com um traficante?"

Morreu na calçada mesmo, que depois das homenagens, dos choros, protestos e promessas, foi devidamente higienizada e esquecida.

Afinal, tanto sangue ao ar livre poderia atrair todo tipo de coisa sórdida, mosquitos, bichos, melhor nem pensar.

A mãe agora lava as roupas e chora a noite, escondida do resto da comunidade.

O pai, pelo visto, ainda não encontrou o cigarro de que gosta.

Paulo César Cruz
Enviado por Paulo César Cruz em 22/11/2018
Código do texto: T6509218
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