minicrônica- O ELEVADO
Chamado de viaduto, mas para ela, o elevado alto, era o caminho de todo dia até a casa do seu Dito, seu patrão.
Não tinha jeito passava por ali todos os dias para pegar a Van do outro lado do viaduto. Depois de sete anos trabalhando em outra cidade, depois que deixara o outro emprego como diarista no apartamento gigante de sua ex-patroa, a "Gran-fina". Depois que ela chamara aquela diarista para fazer faxina no dia seguinte ao que ela tinha feito. (um despeito, mesmo dona Clotilde! Ah, qual é?).
Agora tinha somente que pegar a van, antes era ônibus cheio e a viagem durava duas horas a mais se somasse o tempo de ida e volta. Estava feliz! Sim, claro, muito, muito, muito! Agora sim. Tinha um patrão legal, puxa. Um patrão que era jovem, casado e bem casado. Estava em paz.
Então, tinha se levantado mais empolgada que nunca, rumo ao seu primeiro dia de trabalho no novo emprego. Tomou um banho daqueles demorados. Despida, tinha se olhado no espelho, detendo-se por uns instantes no seu corpo esbelto. (Está bonita! Muito, muito, muito. Apesar de tantos anos de ralação. 47 anos. Tudo em cima! Ah, hoje seu marido vai se esbaldar em você!) Voltaria bem menos cansada. E eles teriam uma noite de nova lua de mel.
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O viaduto estava cheio de moças assim. Moças sonhadoras. Jovens senhoras que se julgam jovens.
Isso é bom. Sim. A juventude é tudo. O sonho também.
Tudo isso se vê no viaduto, a despeito de se ver pesadelos também.
Passam várias jovens com carrinhos de bebê cheios de drogas. Passam moças com shortinhos tipo calcinha. Os sonhos são diferentes. E desses diria que a maioria virariam pesadelos. Alguns não. Alguns apenas passariam pela vida não sonhada.
Ah, o viaduto, nele passa tudo, passa tudo.
E a van espera do outro lado, no ponto e no horário.