Nina, Os Argonautas e "Navegar é preciso; viver não é preciso"...

Adoro as pessoas que, mesmo possuindo cultura, são humildes e infensas ao reclame, à amostração e a toda essa onda de sangria desatada para aparecer dos saberôtos de marré-marré.

Tenho uma amiga chamada Nina (ela vai me dar uns cocorotes por estar decinando o nome dela, mas vou aceitar como se fosse cafunés), professora arretada de geografia, mas devia ensinar literatura e história, porque nessas duas áreas é o cão chupando manga. Além disso, pasmem, canta divinamente e toca muito bem violão. Mas em público não exibe seus dons. Só em ocasiões especiais dá uma palhinha, quase na marra.

Hoje estávamos num barzinhoe conversa vai e conversa vem, começaram a falar de música e poesia. Foi quando um amigo que estava na quarta dose de uisque, está meio desalentado com a situação do país, afirmou: - Como disse Fernando Pessoa: "Navegar é preciso, viver não é preciso!". Logo outro que tamabém estava entornando suas dosesdo cachorro engarrafado (era como Vinicius chamava o uisque) discordou; - Não não foi esse poeta chato português quem disse isso, mas Caetano Veloso na música "Os Argonautas" ha 50 anos atrás. Alguém mais informado mas sem muita convicção afirmou quefora os dois. Mas a discussão continuou. Calado estava, calado fiquei, tomando não uisque, msas umas lapadinhas de Pitu Golde tirando o gosto com um torresminho, por que iria me meter nessa polêmica poética. Erasó o que faltava. Diante do impasse, um cara mais velho que eu, o decano do pedaço, pediu silêncio e disse: - Vamos ao nosso Var, o nosso tira-teima querido: vai Nina esclarece o caso. Fez-se ainda mais silêncio, até nas outras mesas. Ela ficou sem graça, mas precisava esclarecer. Então disse calmamente: - Nem foi um e nem o outro. Tanto o poeta citou a frase num poema, coo o cantor e compositor nua música, talvez até inspirado no poeta. Essa frase, na verdade, foi atrubuída por Plutarcoao general e cônsul romno Pompeu. Ele fora incumbido de buscar abastecimento na África e na Sicília, trazer trigo e outros grãoos numa frota de navios. Quando ia regressar começou ua tempestade e os comandantes ficaram com medo de partir com os navios, foi então que Pompeu pronunciou a cpelebre frase: "Navegar é preciso; viver não é preciso". Acho que foi daí que Pessoa usou a frase no poemae Caetano na sua música portuguesa. Algupe ficou curioso: - Por que musica portuguesa? Ela esclareceu: - Porque a canção "Os Argonautas" parece uma music portuguesa e Ceatano canta-a como se fosse um português. O sueito riu, nao se lembrava da música, ela tem 50 anos. Duvidou balançando a cabeça. Não aguentei, tomei a lapadinha de Pitu Gold fez a caretinha de praxe, além de derrubar a porção do santo e pedi ao garçom o violão que vive guardado debaixo do balção justamente para auxiliar nos tira-teimas. Entreguei a amiga ao violão e pedi: - Nina, canta a música pro cara acreditar e com sotaque português. Ela ficou puta da vida, mas pegu o violão e cantou: "O Barco!/ Meu coração não aguenta/ Tanta tormenta, alegria/ meu coração nao contenta/ o dia, o marco, meu coração/ O porto não!...// Navegar é poreciso/ Viver não é preciso...".

Arrasou, depois rindo pedi a ela para declamar o poema de Pessoa, ela, brincando, meu deu uma banana. Mas se forçasse a barra ela declamaria. Pessoas como ela são raras. São cultas, mas humides, ternas, de bem com a vida, sem ressentimentos. Viva Nina. Inté.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 21/10/2018
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