Então o filho voou

Quando no filho brotam asas e ele desanda a voar, quem fica no ninho se inquieta.

Pensamentos tortos, nublados, chegam alvoroçando o entendimento, chamando medos que deveriam ficar no seu canto sem molestar mais ninguém.

O filho já se diz dono dos seus passos, já sabe descortinar atalhos, já tem a bula do certo e errado tatuada na alma.

Pelo menos é assim que pensa, ou que traduz o seu pensar.

Mas quem sobrou no porto não sossega enquanto ele não se trouxer de volta.

Não chama o sono de vez enquanto a porta de casa abrir pela sua mão. Talvez seja um tolo sentimento, incauto receio, coisa que escorre dos cabelos brancos e das rugas que o tempo, candidamente, faz estrear.

O filho vai à taberna, entorna copos e copos do que lhe servirem, e vai pegar no volante sem aquela precisão que se dizia lúcida.

Vai voltar pra casa se guiando pelas estrelas num céu escuro e atroz.

De nada adiantou incutir no filho toneladas de avisos de cuidado, para que não deixe o álcool fazer valer sua volúpia com tanta verdade.

Esse álcool tão esperto no ofício de embaralhar ideias, de inebriar os ossos da razão.

É assim que as coisas se dão.

Colocamos o filho no mundo para que o mundo cuide dele nessas horas.

Que faça isso da melhor forma.

Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 20/10/2018
Reeditado em 20/10/2018
Código do texto: T6481091
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