Então o filho voou
Quando no filho brotam asas e ele desanda a voar, quem fica no ninho se inquieta.
Pensamentos tortos, nublados, chegam alvoroçando o entendimento, chamando medos que deveriam ficar no seu canto sem molestar mais ninguém.
O filho já se diz dono dos seus passos, já sabe descortinar atalhos, já tem a bula do certo e errado tatuada na alma.
Pelo menos é assim que pensa, ou que traduz o seu pensar.
Mas quem sobrou no porto não sossega enquanto ele não se trouxer de volta.
Não chama o sono de vez enquanto a porta de casa abrir pela sua mão. Talvez seja um tolo sentimento, incauto receio, coisa que escorre dos cabelos brancos e das rugas que o tempo, candidamente, faz estrear.
O filho vai à taberna, entorna copos e copos do que lhe servirem, e vai pegar no volante sem aquela precisão que se dizia lúcida.
Vai voltar pra casa se guiando pelas estrelas num céu escuro e atroz.
De nada adiantou incutir no filho toneladas de avisos de cuidado, para que não deixe o álcool fazer valer sua volúpia com tanta verdade.
Esse álcool tão esperto no ofício de embaralhar ideias, de inebriar os ossos da razão.
É assim que as coisas se dão.
Colocamos o filho no mundo para que o mundo cuide dele nessas horas.
Que faça isso da melhor forma.