Quadro sem moldura

Tenho endurecido um pouco, você certamente iria notar. Também repararia na minha escrita quase escassa. Em meio a isso, sem delongas, às vezes penso que cheguei naquele ponto da vida em tudo que eu tinha pra ver já vi, vivi, chorei- falo principalmente das coisas bonitas. E, então daqui pra frente tudo que me sobrou vai ser seco, doer feito álcool jogado num ferimento recém aberto. Tudo me rasga por dentro e me cospe para fora. Coisa feia essa de se queixar de tudo. No mais, andei trombando em desilusões, desassossegos e não consigo mais rir de coisas bobas como antes. Sinto que a vida nesse momento é como aquele café frio que quando é colocado na boca logo é jogado pra fora. Viver ultimamente de sol a sol tem sido assim, parecidíssimo com aqueles discos que se pula todas as músicas para que se chegue numa única que salvará todas as anteriores, mas sem essa música em questão. Contudo, boto os pés no asfalto com o anseio de reconhecer algum rosto que me faça engolir o choro e esquecer de tudo por um tempo, raramente acontece. Eu queria te dizer que quando escapo de tudo isso, é sempre pensando naquilo que não aconteceu e com alguns devaneios tento preencher as lacunas que ficaram com aquilo que poderia ter sido e acredito ainda que será. Porque sei que é a única coisa que me salva, entende, então respiro e prossigo, pois no meio de toda essa lama crer em algo é a única forma de não cancelar o próximo batimento cardíaco.

Anny Ferraz
Enviado por Anny Ferraz em 30/06/2018
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