Essas coisas acontecem

Era 1964, mês de março, eu fiz um concurso para um banco oficial. Tive que fazê-lo, obrigado por meu pai que não suportava mais a minha malandragem. Por incrível que pareça - até eu fiquei estarrecido - fui aprovado. Mas antes de tomar posse, aconteceu o golpe militar. Meu pai foi preso, nossa casa foi invadida, muita gente ficou com medo até de falar conosco... Um inferno.

Mas, convocado, em junho pelo banco tomei posse. No entanto, logo nos primeiros dias eis que surgiu uma pedra danada de grande no meu caminho: a direção do banco mandou saber se era verdade qiue eu assinara uma lista pedindo a legalização do PCB. Era verdade. Mas o gerente do banco, que tinha um parente no Recife na mesma situação, resolveu a parada, ele mesmo botou uma notinha bem miudinha no Diário da Noite onde eu dizia que assinara a lista pensando que era para calçar a rua onde eu morava (a rua havia sido calçada há mais de 30 anos). Colou, ele mahdou o recorte, tudo nos trinques. Pensei que estava tudo resolvido no tocante ao probema de minhas ligações com o comunismo. Não estava.

Meses depois, para ser mais exato um dia antes da véspra do Natal, naquele ano de 64, apareceu na agência uma auditoria. E nao uma auditoria qualquer, mas comandada pelo chefe dos auditores e um auxilar que era cpnhecido como o terror dos funcionários, á tinha demitido dezenas. Nem liguei, era novo no banco, não tinha praticado nada de errado... Bom, os caras fozeram logo o de praxe conferiram o caixa, pediram alguns documentos e ficaram ali fazendo o serviço deles. Mas aí, olha o aí, o moreno auxiliar durão e chato me chamou. Pensei que era patra pedir documentos. Não era. Mandaram que eu me sentasse. Sentei. Então o moreno começou a me perguntar se eu havia sido leitor do jornal Semanário, do Novos Rumos, da Folha do Povo... Res´pondi que sim, nãolia mais porque haviam sido fechados. O cara ficou puto, perguntou sobre grupo dos onze, célula comunista, liga camponesa... Mas o chefe fez um sinal com a mão e ele parou. Esse cara então me fez uma pergunta que achei absolutamente estranha: - Você conhece o coronel do Exército Fulano de Tal? Disse que não. Realamente não conhecia nem de nome. Mas ele acrescentou: - Esse susjeito mand mais que o governador. Foi adiante: - Conhece o Diretor do Dnocs, sicrano de tal? Não, não conhecia. Ele foi adiante e o acerbispo do Ceará? É claro que anão conhecia. Então ele riu e disparou: - Pois você não foi demitido por causa dos três. Mas a quem você deve de verdade o seu emprego é aquem fez esse pessoal interferir a seu favor. Então me mostrou uma denúncia feita pela elite da cidade pedndo a minha demissão por ser filho de comunista fichado e preso, e queminha presença no banco era auma ameaça à sociedade. Fechou a pasta. O moreno ainda perguntou se eu conhecia algu´pem capazde ser interlocutor junto a essas autoridades. Nem respondi, o outro. - Zé, deixa de perguntar besteira, é claro que ele nao sabe, nem nós sabemos, vá datilografe o relatório dizendo que o rapaz anão oferece erigo nenhum e a denúncia ´pe completamente infundada, conforme nós fomos incudidos de fazer. Foi a audiitoria amais rápida da história. Durou até o meio-dia. Eu j´pa estava com a minha malinha, ia para Arcoverde passar o Natal. Ainda vi os dois saindo no carro de praça que os levaria a Recife onde pegariam o aviãoa para Fortaleza. Antes de ir embora, o chef dos auditores me dissebaixinho: - Ó homem que pensa e n~çaoa é socialista, é burro.

O tempo passou, uns 20 anos depois eu estava tomando uma cervejas nas cadeiras da calçada de um bar em Pesqueira com alguns amigos, quando um padre que era conhcido como chato, mas que se dava comigo na base do bom dia, parente afastado de minha mãe, diante de uma provocação de um amigo queo convidou para tomar um copo de cerveja, ele se sentou. E tomou o copo de cerveja, aguentando as provocações desse amigo brincalhão, então se voltou para mim e disse:

- É isso, tem muito esquerdista que me deve favor e nunca nem desconfiou. A vida é ceia de supresas. Não disse mas nada,a matei a charada, fiquei completamente aturdido.

Essas coisas acontecem. Nunca mais tocamos no assunto, nem eu e nem ele. Mas o cara me salvou de ser demitido. Tinha um prestígio que nunca ninguém desconfiou. E sempre foi da direita. Inté.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 27/02/2018
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