Oito de Novembro - Texto 01

Aquele oito de novembro de um mil e novecentos e setenta e quatro, às vinte e uma horas, foi o dia em que Kelly esperava o noivo com uma expectativa e uma ansiedade diferente das outras vezes, que o esperou sempre. Aquele seria o dia, em que confirmariam a data do tão sonhado e esperado casamento, pré-datado para o dia vinte de dezembro de um mil e novecentos e setenta e quatro.

Mas alguma coisa havia de diferente e errado com o noivo. Um jovem decidido, esforçado, genioso, que daquela vez, fez do sonho dos dois um pesadelo amargo e doloroso... cruel.

Ele, o noivo Kenedy, reclamou que ela, a noiva, não havia feito as unhas. Ela explicou que como trabalhara fora durante toda semana, aquele era o dia de cumprir as tarefas domésticas, e por isso não tivera tempo.

Kenedy reclamou que a noiva estava com o cabelo preso, coisa que não o agradava, não gostava. Kelly disse que havia lavado naquela hora e para que ficasse bonito tinha que prendê-lo, mesmo molhado, o que havia feito.

Kenedy reclamou também que sua roupa estava sem passar, muito amarrotada. Ele não entendeu que aquele tecido era um estilo novo, na moda, para usar assim amarrotado.

Então, quando tudo parecia não haver mais nada a ser dito e explicado, sobre tão simples motivos de desentendimentos de duas pessoas que se amavam demasiadamente, ela, senhorita Kelly, simplesmente ficou a olhar para o rosto do noivo. Sem palavras para dizer, perdida em meio a tanta crueldade de uma só vez. Ele então ficou mais irritado e se exaltou ainda mais. Pegou a mão de sua noiva e foi retirando a aliança de noivado de seu dedo, e após, retirou a sua aliança também.

Naquele instante um longo filme passou diante de seus olhos. Kelly lembrou-se do primeiro encontro, da primeira vez em que andaram de mãos dadas, dos primeiros beijos, das primeiras cartas, dos telefonemas, das esperanças, dos sonhos de construir uma família e de muitas aventuras na vida a dois. Despencou-se do mais alto despenhadeiro e se envolveu em um tremor intenso e involuntário, que sacudiu seu corpinho encantador, parecia até que não cessaria jamais.

Kenedy perguntou: _Você está sentindo frio? Deve ser um resfriado que pegou, não é mesmo?

Até hoje não se sabe se Kenedy entendeu a inocência de Kelly. Aquela era uma emoção totalmente nova, em busca de outras medidas e atitudes, que brotariam com certeza, nas próximas decisões.

A lembrança do primeiro beijo... um simples encostar de lábios, mas que ele, aos poucos e com muito carinho, paciência, lhe ensinou que poderia ser diferente, e não só daquela forma, mas que foi tudo lindo, puro e inocente, verdadeiro, sem rancores, sem mágoas, enquanto existiu na liberdade dos dois e até hoje.

O dia do sonhado noivado foi tão lindo! Tão emocionante, belo e mágico! E agora ele lhe tirava a aliança que seu querido pai havia colocado em seu dedo, e com isso ele lhe tirava também todos os seus sonhos encantados, toda esperança de ser feliz.

Naquele momento, a entusiasmada menina noiva Kelly, deixou de existir, e mesmo com todo sofrimento que trazia e levava consigo as noites insones, as olheiras dos dias seguintes. Ela ignorou os conselhos para que o procurasse e jurou a si mesma, que não fora a primeira vez de sofrimentos e desgostos, de colocar as alianças e retirá-las. Seria a última e nem aceitaria, jamais, desculpas daquele menino que tanto amava, ama e amará.

E agora, meu Santo Deus? Mesmo tendo passado trinta anos, a lembrança vem mais forte, mais viva. É insuportável a cada minuto que passa, a cada ano... Esse dia oito de novembro ficou no marco histórico, como a lembrar de um fim que é ainda hoje inexplicável. Assim como inexplicáveis, também são as atitudes de Kenedy, naquele dia de sonhos lindos, que se transformaram em fumaças e amargas recordações e da inflexibilidade e orgulho de Kelly, no fazer aquele juramento absurdo, que levou muitas pessoas ao sofrimento... A rejeição e o abandono a fizeram cumprir com correção monetária, juros e todas as tarifas foram inseridas sem dó e piedade, sobre suas atitudes impensadas, de jovens inexperientes no campo dos sentimentos. E que pagaram, pagam e pagarão muito caro por esse imenso planeta terra, onde ninguém sabe de nada.

Só Deus sabe e poderá ajudar diante de tantos vacilos, fraquezas, ambições, orgulhos, ignorâncias mortais, que acabam se transformando em fortes pesadelos para muitos inocentes em pecados, em absurdos, em sofrimentos e também em ricas fontes de desejos emocionais, que elevam a imortalidade do amor.

BOM DESPACHO/MG, 08 DE NOVEMBRO DE 2004, ÀS 21:00 H.

João Batista Silva
Enviado por João Batista Silva em 16/01/2018
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