Picadinho arretado com arroz soltinho

Há pessoas que são marcantes pela sua simplicidade e maneira de ser, não mudam seujeito, seu sotaque, suas peculiaridades e valorizam demais sua história de vida e sua terra.

Uma dessas pessoas é um amigo do sertão, sertanejo de fato, sufoca fora do sertão. Adoro me encontrar com ele e bater um papo longo. Isso aconteceu ontem, ele veio visitar os filhos que estudam aqui no Recife, veio dar um geral, segundo ele, a melhor ração para o gado é o olho do dono. Politicamente incorreto? Nao, não conheço pai mais carinhoso com os filhos. É viúvo, por isso ainda cuida mais intensamente dos filhos. Nessa palestra, tomando uma lapadas se pitu gold e tirando o gosto com uma linguicinha do sertão, calabresa para ele não tem gosto, osujeito me contou uma novidade, ouço mais que falo, deixei ele se expandir porque o importante é ouvir as novidades dele:

- Mermão, tu te alembra de Niquinha?! Num vá dizer que não se alembra. Aquela que ainda moço, com meus vinte e tarará me arriei os qatro pneus, aquele mulherão lino que veio do Pajeú, metida a independente e negociante, que se auntou comigo por nus cinco ou seis anos, mas adepois começou a viajar para Sunpaulo pra vender renda e trminou arrumando um ponto por lá e morando naque capitá e porisso nos separamo... Ela como tu sabe fez muito dinheiro, arrumou uns sujeitos, nu deu certo, e depois de muitos anos vortou pra lá, pra terrinha. T´pa vivendo com o que ganhou, mas ainda faz bico mandando renda pra Sunpaulo. Apois, nóis assim que nos vimos bateu de novo a simpatia, maizi num chegamo aos firnamente ainda. Tinhosa, a danada sabendo meu fraco, me convidô pra comer uma coisa que adoro, tu sabe o que é, aquele comida que minha mãe fazia e a danada aprendeu atpe a faz^^e mió pruquê descobriu uma erva especiá. Diz, mermão, diz o que é!"

Falei: - Picadinho de fígado e arroz soltinho.

- Tua cachola inda tá boa demais. Apois ela caprichô, botou na panela o picadinho, aquele cubinhos pequenininho, com banha de porco, alho, cebolinha, coentro, alecrim, pimentinha e as tais ervas que elavortou a pratar no muro a casa nova dela. E fez aquele arroz nbranquinho, branquinho e sortinho, sortinho. Depois botou num troço alihado tipo aqueles de casa de rico e trouxe a panela que consinhou e botou na minha frente, do keito de antigamente, botei o arroz dentro, uma porção grande do picadinho, mexi bem muito, peguei a colher de sopa que comi que nem um condenado, e de vez em qando, como notempo de mimha mãe, tomando um gole de refresco de caju. Ôta coisa: a danada botou na vitrola dela aquela música que eu sempre ouvia na hora do armoço na casa de mãe pela difusora do cinema, aquela música que tu tmbém gosta que fala no barracão de zinco sem pintur lá ano morro, que aquela Darva de Olivera canta. Depois de comer o icadinho, a danada troçe um pédação de giabada cascã e uma torá de queijo de quaio, comi tudo, ela ainda me servu um copinho pequenininho de licô de jenipapo e uma xícara de café quente. Aí, mermão, como sempre fazia na casa de mãe e na antiga casa que morei com ela me sentei numa poltrona fofa, bem fofinha, dei um arroto, soltei os dois pedinhos de costume e tirei um ronco. Nem ao menos fiz o agradecimento que ela tava querendo prquê os fio dela chegaro de repente. Maizi, fique certo, nesses dias o armoço vai ser completo".

Ficamos por ali conversando amenidades, mas eu com uma inveja danada do picadinho. É a única comida que como com arroz, detesto arroz, mas com o picadinho misturado na panela eu tamabém como como um condenado, e também a giabada, o queijo de coalho e se possível ouvir a tal música. Nesses dias pinto na casa deles, acho que dentro de uma semana eles se juntam de vez. Ah, que vontade de comer picadinho de fígado, mas a deieta proibe. Ah, vida. Inté.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 13/11/2017
Código do texto: T6170584
Classificação de conteúdo: seguro