Pernas de Paulo
Pernas de Paulo
Muito difícil acompanhar as pernas literárias de Paulo Miranda, um dos melhores Recantistas. Já andei de pernas de pau e nadei de pés de pato e sei que vira covardia disputar com quem não usa esses artifícios. O Paulo, sem artifícios que não o extraordinário conhecimento do idioma e incomparável senso de humor, a uma velocidade incrível, produz textos de excelente qualidade, num estilo ora clássico, ora saborosamente popular, quase em dialeto pitanguiense, ou pitanguês, como está sendo batizado. Em todo caso, acho melhor etiquetar esse socioleto como brumadês, dialeto exclusivo da freguesia de São Gonçalo do Brumado, de modo a não melindrar o amigo com o imperialismo cultural e colonial da Velha Serrana. É para "sungar" o nível, como se diz naquela terrinha, a Macondo mineira!
Por isso, além da prodigalidade da produção, é impossível competir com ele quando os temas são a infância em Brumado e os primeiros anos de Pitangui, do que guarda lembranças vivas, exagerando nos detalhes. Dá até pra cheirar as jabuticabas, as mangas, as mixiricas, as flores dos jardinzinhos bem cuidados, esgueirar-se das cercas de mandacaru, enxergar os boizinhos entrelaçando as telas de arame, as mulatas-da-sala enfeitando as calçadas de pedra ou de chapisco, à porta das casas modestas, como a da gente humilde daquela canção popular. Dá quase para ver de novo a meninada nadando na Maria Garupa, no Rio São João, o incenso perfumando a igreja na hora da reza ou a coroação da Virgem em pleno friozinho de maio, as famílias na porta das casas conversando ou escutando rádio. Dá também para escutar de novo o trem-de-ferro apitando na curva do Pitaceso, indo ou voltando de Belo Horizonte, e recordar as relações umbilicais entre a fábrica de tecidos e os habitantes do povoado.
Como uma sugestão de deliciosa crônica, não posso deixar de recomendar o "Galim Galinzé". É fantástico, em todos os sentidos.
Continua, Paulo, que os leitores agradecem!