CHORO BOM

Na época ainda estava verde como compositor. Um dia tentava lembrar uma composição do Paulinho da Viola chamada “choro negro”, arranhando ao violão alguns acordes e tentando cantarolar a melodia que tinha ouvido há pouco tempo ser tocada em dupla pelo Dantas e Gervásio, os dois melhores violonistas do nosso grupo. Depois de mais ou menos meia hora tentando lembrar a melodia, sem conseguir, pois ainda não tinha sido registrada no meu HD mental, verifiquei que, como ainda não tinha nenhum arquivo salvo no meu computador cerebral, acabei chegando à outra melodia nova, completamente diferente, também um choro, e um choro bom...

Completei logo com uma letra e defini, do meu jeito amador, os acordes, em ré maior, com uma porção de diminutas.

Domingo, quando encontrei com o Edyr Proença no Lago Azul, que ainda não sabia dos meus dotes de compositor - nem eu acreditava muito neles - mostrei a ele, junto com outra música o “Choro Bom”:

Que choro bom, beleza de canção

Surgindo assim quando te vê sorrindo

Fez harmonia ao som do coração

A melodia vindo da emoção de te querer

Quando te vi vestida de luar

Mais linda e nua do que a própria lua

Senti no ar o cheiro da paixão

Senti por dentro a luz do teu olhar

E o choro então

Ficou mais lindo ainda quando viu

Donde é que vinha aquele teu sorriso

Encheu o ar

Fez do encanto teu

Caminho do prazer

Brincou com o som

Veja só meu bem

Que choro bom

O Edyr elogiou as composições, sugeriu a mudança do tom do choro para lá maior e deu a maior força para que eu continuasse compondo. Fiquei todo lisonjeado. Afinal o reconhecimento do autor do “Bom dia Belém” não era pra qualquer um.

Quando o Clube do Camelo gravou seu primeiro CD o “Choro Bom” foi uma das musicas escolhidas, por unanimidade, para fazer parte dele. Como eu achava que o choro não era o meu estilo de cantor, informei que gostaria que fosse interpretada por outra pessoa, de preferência do sexo feminino.

O maestro Tynnoko, responsável pelos arranjos do CD, logo indicou algumas cantoras que poderiam representar bem nossa intenção. Nos ensaios do Clube ouvimos duas das indicadas para que a escolhida tivesse o aval dos Camelos. A Jaceli Duarte foi a escolhida por todos, embora a outra também fosse uma excelente intérprete. Foi a única cantora externa que participou do CD. Todas as outras músicas foram interpretadas por membros do clube. A escolha ainda gerou alguns descontentamentos de outras cantoras que também gostariam de gravar, mas por algum motivo não tiveram oportunidade de fazê-lo. Mas isto já é outra história...

Fiquei satisfeito com o resultado. Escutem e vejam se concordam comigo:

http://www.recantodasletras.com.br/audios/cancoes/73980

A gravação ficou impecável com musicos do primeiro escalão como o baixista Ney Conceição, que na época ainda não era tão famoso, mas já tocava tão bem quanto hoje.

Interessante que quando foi pra Jaceli aprender dei apenas um áudio gravado na minha voz sem a letra escrita. Apenas na fase de estúdio dei a letra impressa, mas aí ela já tinha decorado do jeito dela e na segunda parte cantava “brincou, gozou...”. Com muito tato disse a ela que era “brincou com o som...”. Até que a gozação fazia sentido com a parte anterior que falava em “caminho do prazer”. Mas ela aceitou brincar com o som e ficou mesmo sem a conotação erótica...