O Dia do Vizinho

O Dia do Vizinho

Por: Soaroir Maria de Campos

2/8/07 (Para Crônicas do RL)

A fim de amenizar meus dislates (gostei desta palavra) tento, na maioria das vezes, justificar a minha conta de luz pesquisando na internet sobre os temas antes de escrever sobre eles.

Este foi o caso quando hoje decidi colaborar com o RL fazendo uma crônica sobre Vizinhos. “Será que já instituíram o Dia dos Vizinhos” pensei. E zás-trás: lá estava já na 11ª edição e na primeira linha do Google http://www.radiorural.com.br/vizinho2007/.

Entrei e, adivinhem só, “19 de agosto! Entrem nesta festa!”. Mas meu entusiasmo logo murchou porque a participação era só até o último dia 30.

Não vou desistir, afinal, história de vizinho nunca vai faltar. Sem muito esforço me vem a lembrança do “seu” Anésio. Aquele sim era pau pra toda obra. Conhecia a vida de todos os condôminos, havia visto crescer um monte de moleques que já são doutores. De cano furado até hamsters descendo pelo paredão do 10 andar abaixo, o homem cuidava prontamente, diferentemente do que hoje anda por aqui, a quem outro dia pedi que me ajudasse a mover um piano com rodinhas, mas antes que pudesse terminar a frase me informou que a sua “espinha” não lhe permitia pegar peso. Paciência... Mas aquela droga de caixinha sorridente lá na portaria por ocasião do Natal não vai levar nenhum agrado meu, prometo.Voltemos ao assunto.

Do lado esquerdo do meu apartamento morava uma sorridente “loiraça” do tipo que todo adolescente sonha ter como vizinha. Era festa sexta sim e outra também com copos tilintando na varanda, local onde durante o dia servia para seu banho de sol.

Nunca me incomodei com nada daquilo mesmo porque, além de sábado não ser dia de se acordar cedo, eu também sou adepta de uma patuscada às sextas-feiras. Nunca houve nenhum intercâmbio entre nossas festas mas aquela animação, de alguma forma, já fazia parte de nossas vidas por mais de dez anos.

Em um fim de semana qualquer, livre dos aparatos de executiva, dançava eu ao som de Mirian Makeba quando atinei que fazia tempo não se ouvia mais sons vindo do apartamento ao lado. Coincidentemente naquela mesma semana deparei , no elevador, com a mãe da loira, que morava em outro estado, que, aparentemente, providenciava uma mudança. Aproveitando a oportunidade perguntei: “Não tenho visto a Nelza, ela se mudou?” Sem levantar a cabeça, “não”, me respondeu a mulher. A viagem até o térreo parecia mais longa do que a de um vôo espacial. Deu até tempo para eu me sentir ofendida com aquela resposta seca encerrando qualquer possibilidade de estreitamento entre vizinhos.

Sem sequer sussurrar aquele plástico “ciao” deixamos o elevador . Ao cruzar com o Sr. Anézio repeti a pergunta: “Por onde anda a minha vizinha que não tenho mais visto?” - “Ih dona Soaroir, não deve existir nem mais os ossos dela”. - "Como assim?! – “Pois é, morreu faz um tempão”. Tomada por um sentimento estranho segui meu caminho.Mais tarde, com meus botões e uma sensação horrível, pensava como aquela moça aparentemente tão saudável havia morrido e o pior, eu não percebi. Será que precisou de ajuda, já que morava sozinha... Passado o susto e com a mórbida curiosidade característica dos humanos, alguns dias mais tarde procurei pelo zelador para entender o que realmente havia acontecido com a minha vizinha, mas a filha dele me disse que ele havia morrido.

Cruzes! Como fica a Convenção?... Como pode a morte invadir um condomínio, levar sem prévio aviso as pessoas boas e sequer deixar um comunicado no quadro de avisos!?

Por precaução parei com aquela pesquisa e nunca soube como morreu a minha vistosa vizinha, mas pelo menos agora com uma data instituída, a cada 19 de agosto seremos notificados sobre quem tem problema de espinha, quem partiu e quem ainda anda por aqui fazendo perguntas.

(Sem revisão – será feita oportunamente por mim ou por algum bom vizinho do RL)