O Nariz

Pode ser que haja clichê na afirmação, mas fato é que o ditado popular não está errado: Gosto é igual... nariz, cada um tem o seu. E Alberto, que tinha um bom gosto inquestionável, bem que gostaria de ser mais notado por esta característica do que pelo enorme nariz, daqueles que são grandes para a frente e para os lados, tomando conta do rosto da pessoa e até mesmo se tornando ponto de referência.

- É herança de minha descendência francesa, ele tentava explicar, para tornar charmoso o fato de ter tamanho narigão. Mas não adiantava. O jeito era aguentar os apelidos nada originais e as piadinhas de mal gosto com um sorriso plácido, fingindo que não se importava. Pois havia aprendido, na adolescência, que quanto mais demonstrasse desagrado, mais a coisa rendia.

Mas a verdade é que Alberto se importava. Era um homem vaidoso, e lhe desagradava muito olhar no espelho aquele nariz espetacular sem poder fazer nada a respeito. Sempre pensava em fazer uma plástica, quando o dinheiro desse, mas o dinheiro nunca dava, uma vez que seu bom gosto não conhecia limites, nem de cheque especial e nem de cartão de crédito.

Ás vezes, Alberto esquecia-se do próprio nariz durante um ou dois dias, quando comprava uma roupa nova de excelente qualidade ou mais um quadro exclusivo para o apartamento bem decorado. Mas quando a noite chegava, e ele colocava o pijama e ia escovar os dentes, lá estava: acabava indo dormir atormentado pela vontade de não ter aquele narigão.

Um dia Alberto acordou e descobriu que não tinha nariz: nem grande, nem pequeno, nariz nenhum. Apenas dois furos discretos no meio do rosto, por onde respirava. No começo sentiu um certo alívio: nada daquele volume sobre seu sorriso de dentes perfeitos. Mas olhando bem, ficou bem esquisito. Parecia um E.T. Ou um sapo. Não tinha certeza. Só sabia que não era bonito de se olhar.

E falando em bonito de se olhar, Alberto resolveu vestir-se antes de pensar nesse problema. Sempre pensava melhor quando estava bem arrumado. Normalmente gastava um tempo diante do armário, combinando camisas, cintos e sapatos, mas valia a pena, pois suas combinações eram perfeitas e sempre elogiadas. Mas naquela manhã estranha ele olhou o guarda roupa por um tempo considerável, sem saber ao certo o que escolher nem como combinar. Parecia que seu senso natural de elegância havia desaparecido junto com o nariz. Experimentou dois ou três conjuntos, optando pela primeira combinação, mas sem muita convicção. Saiu inseguro, desfilou pelas ruas (como sempre fazia), mas não observou nenhum olhar admirado. Apenas um ou dois suspiros reprovadores.

Chegando no trabalho, chamou a atenção de todos enquanto passava entre as mesas do escritório. A secretária gaguejou logo após um “bom dia” meio pasmo:

- Senhor Alberto, o senhor hoje está... diferente...

- Deve ser o meu nariz, Carminha... ou a falta dele!

- Está muito estranho, parece um E.T. – comentou um colega, metendo o nariz onde não foi chamado.

- Sinto-me um E.T. mesmo, quando passo por seres humanos como você – Alberto resmungou, mas realmente não se sentia bem. O dia transcorreu da maneira mais anormal possível: os colegas cochicharam o dia todo sobre a falta do nariz e da elegância, o chefe não prestou atenção em nenhuma palavra sua durante a reunião, distraído com a face disforme de Alberto. No final do dia, passou por ele, dando-lhe um tapinha nas costas, e comentou:

- Meu amigo, você precisa dar um jeito nisso!

Como se não bastasse, após o expediente, durante o happy hour, os amigos o alertaram para a cafonice de sua roupa naquele dia:

- Nem parece o Alberto elegante que conhecemos! Parece que seu bom gosto se foi junto com o nariz!

Alberto chegou em casa em estado depressivo. Foi direto ao espelho, onde analisou com grande desespero o rosto estranho, sem nariz.

- Só pode ser um pesadelo – disse para a triste figura no espelho, em voz alta.

E era mesmo.

Alberto acordou e imediatamente colocou a mão no nariz: lá estava ele, grande, espalhafatoso, presença marcante onde quer que fosse. Ah, como era bom que estivesse lá! Vestiu-se com especial cuidado naquele dia, recebendo de bom grado todos os elogios. E quando alguém fazia alguma galhofa de seu nariz, ele parecia não se importar. Apenas sorria e dizia:

- É grande, mas é meu. Melhor do que nenhum...

E realmente não se importava.