2029: ALMOÇANDO COM OS NETOS
Era uma dia primaveril ensolarado, temperatura amena, agradável para qualquer coisa. Por isto mesmo, combinara com os netos VICENTE, THOMAZ E PEDRO um almoço em casa para confraternização e realização de um desejo geral para degustação abundante de um à la minuta da melhor qualidade. Encontrei os guris muito alegres e cheios de energia, o que revigorou meu ânimo, um tanto combalido nos últimos dias, pelos tradicionais problemas respiratórios, que tendem a se agravar após os 80. Era um contraste forte de vida entre os meus oitenta e três e os dezesseis, dezessete anos dos piás no encontro tranquilo de família. Depois dos beijos, abraços e as brincadeiras de estilo, demos o início aos trabalhos com o chimarrão, sempre com a boa erva misturada do Mercado Público. Vicente, um pouco mais velho e mais inquieto, resolveu adentrar a ordem do dia: “Vô, qual o conselho pra escolha da Faculdade e da profissão?”. Depois de sorver um gole largo da boa erva, dei a largada, mais ou menos assim. Em primeiro lugar, queridos netos, o importante é vocês se conheçam bem; o autoconhecimento é a chave: no que são bons, no que não são, o que gostam mais de fazer, o que não agrada a vocês. Quem não é bom em matemática ou física, a rigor, não tem muito campo na engenharia, por exemplo. Parece coisa óbvia, mas tem gente que se ilude ou que não acolhe corretamente suas limitações. Depois, é preciso que saibam medir sua ambição, seu desejo de crescer ou destacar-se, o que pode condicionar seu empenho para o estudo em profissões que muito exigem, como a Medicina, que é vocação pura, muita alma, ideal e dedicação aos estudos. O Direito também seria assim, com mestrado, doutorado e muito, muito foco, para não morrer na praia, com água pelas canelas. Ideal de vida, temperamento, gosto e facilidade para estudos podem definir praticamente o rumo profissional. Gostar da futura profissão é importantíssimo, mas não basta para o sucesso e a realização pessoal, pois nada substitui o esforço, senão eu teria feito Canto Orfeônico, Teatro ou atividades mais lúdicas, sem qualquer menosprezo aos que realmente se dedicam a tanto. E procurem cursar uma Faculdade de nível, combatendo com os fortes. O mundo tende a ser cada vez mais competitivo. Ser apenas mediano, “meia-boca”, portanto, é quase nada nestes novos tempos. Se desejar ser carpinteiro, soldado, jardineiro, plantador de mandioca, é preciso lutar para ficar na vanguarda. Se o melhor caminho na profissão escolhida tiver como grande alternativa o concurso público, que façam os melhores. Se não vingar, tudo bem, faz parte, ninguém pode atormentar-se em função do sucesso - que é algo impreciso e assaz discutível. Mas tentar com afinco é, por si só, um grande prêmio. Sentar à beira-mar, escrever poemas, comer, beber, dormir longas horas é bom, mas tem de ter farinha no saco, muita areia no caminhãozinho, sacou? Uma coisa é certa, se quiserem “coisinha boa”, vida agradável, mordomia, independência vão ter de ralar muito, porque o “malandro”, o folgado, acabará frustrado, atacando o mundo e criticando a sociedade por sua própria incapacidade: um bico aqui, um encosto ali, uma enganação acolá. É a regra geral, não é absoluta. Infelizmente, tende a acabar como roupeiro ou gandula, ao invés de jogar como titular no time. Neste conjunto de coisas, vocês têm de procurar o equilíbrio e os seus caminhos. Agora, tem um negócio que vai ser constantemente base de sucesso na vida e na profissão: a leitura. E, se conseguirem desenvolver a arte de escrever bem, vocês terão sempre um grande trunfo na manga, seja pra isto, seja para aquilo. Agora vamos almoçar, que a minha barriga já está roncando, imagino a de vocês.