Pombos e bombas

Pombos infestam a cidade, assim como cabeças vazias. Pobres aves que, hoje, têm de conviver com nós humanos. Outrora simbolizaram paz e comunhão, levaram o sinal à Moisés, foram glória e luz, que se apagou com o movimento dos ponteiros do tempo.

Todo ser humanoide deve ter seu correspondente Columbidae. Ave que efrenta arranha céu e antenas de Tv, somente pelo gozo de defecar em nossas cabeças.

Por onde passamos podemos ver seus sinais, seus pescoços trêmulos e sua dor por terem-se tornado um animal imundo. A beleza é unica aos olhos do homem que ama, que por amar,somente, a vê no seu objeto amado. Para mim, os pombos são animais tecidos pelos magníficos dedos de Afrodite.

Em todo asco, repugnância e desgosto, os pombos são lindos. Não devo a minha inlucidez aos suspiros etílicos, mas o meu torpor emana do próprio mundo, que já

não me cabe.

Senhores da arte pintem os pombos, entregue os a sua aura e sua gloria. A arte nos trouxe de volta ao mundo dos homens. Van Gogh, Gauguin, Matisse e Manet ancoraram nossos espíritos de volta em seus portos. Orfeu amou, e por tanto amar, viu sua amada, pela última vez, em um triste sorriso pétreo.

Resta-me cantar os pombos, a minha musa foi dilacerada por bala perdida. Os pastores de Virgílio, pobres coitados, são Virgílio.

Homens que lutam contra si, para terem o direito de defecaram sobre a cabeça de si mesmos, humanidade muda. Homem contra homem. Pombos reproduzindo e multiplicando, gênese e destruição.

Imaginem a metafísica dos pombos, abstrações desfilosofadas, somente o abstrato disperso no ar. Eles não postulam uma moral, mas todos vão à praça aos domingos.

Pombos brancos, pombos pretos, pombos mulatos e pombos pardos.

Concubinas foram as prediletas dos imperadores, vasta é a história do homem, maior é vida das aves. Angústia e melancolia, palavras que não rimam, porém estão amarradas. Vos esculpais uma estatueta minha, nela registre minha dor. Coloque os pombos sobre meus pés, pinte-me de vermelho para lembrarmos do sangue derramado até nós e, depois, atire-me em um poço, local de onde nunca deveria ter saído. Pobres pombos, pobres homens.

A escuridão da consciência espalhou-se sorrateiramente, hoje vivemos na total ausência de luz. A bruma da sabedoria não aguentou os sopros de Zéfiro, ela foi levada para longe. Esperamos que Hermes nos traga uma mensagem do Olimpo, aguardamos os adornos da alma. Que a retórica descompromissada ocupe o vasto vazio cerebral.

Que Drummond seja lido em banheiros públicos, o mundo precisa dos poetas, para sermos, novamente, humanos. Nossa música tornou-se uma importação pobre de melodias que não fazem sentido algum. Nossa cultura é o X-burguer e o garção de costeleta.

A criança que chora por não ter o que comer, recebe migalhas que acalmam seu estômago, mas não só de pão vive o homem. Vamos comer poesia, vamos comer arte, vamos comer literatura.....

Humanidade que as máquinas retiraram até a última gota de seu suco. Este escoa como esgoto fétido. Pombos que não encontram seu lugar na metrópole.

Espírito destruído, postulado metafísico pregado na cruz. Homem que se explica pelo inexplicável, onde está o verdadeiro homem?

A baixo do próprio lodo, os homens pedem socorro, mas o sofrimento dos homens é o sofrimento de Edipo, a salvação humana é não ser salva. Por isso, então, olhemos para os Pombos