Uma nova (era)
Vivemos uma nova era. A era da tecnologia. A era da informação. Uma era globalmente conectada, interligada o tempo todo.
_ Compadre você já percebeu como as crianças de hoje nascem com uma mente altamente desenvolvida.
_ Percebi, compadre. Um dia desses, eu fiquei foi besta em ver a minha sobrinha, que ainda nem tem três anos de idade, mexendo num celular. Homem eu fiquei foi encabulado com tudo aquilo, eu mesmo não faria nem a metade do que ela fez e de forma tão rápida.
_ É meu compadre, os tempos, hoje, são outros. No nosso tempo, por exemplo, as coisas eram muito diferentes. Ainda me lembro, talvez tivesse uns cinco a seis anos de idade, que eu chorava pedindo a minha mãe para me deixar ir para a escola junto com os meus irmãos mais velhos.
_ Você tem mesmo boa memória, compadre. Pensei que fosse só eu que lembrasse dessas coisas.
_ Lembra, compadre, que a gente vivia solto, brincando pelos matos e quando a gente encontrava alguém a primeira coisa que perguntavam era de quem a gente era filho, onde morava, quantos anos a gente tinha. Era um interrogatório que parecia não ter mais fim.
_ E a gente respondia tudo direitinho, não é compadre. “Como é seu nome, filho?” “Meu nome é Pedro”. “Você é filho de quem, menino”? “Sou filho do seu Pedro e da dona Francisca, a gente mora na comunidade Capuamo, perto do Encantado, próximo ao Rio dos Matos”.
_ Pois é, compadre, as crianças de hoje são bem mais sabidas do que nós naquela época.
_ Não sei, não, compadre! Tenho lá as minhas dúvidas.
_ Por que, compadre?
_ Homem de Deus, não é que eu encontrei um menino perdido ali na Praça da Matriz e fiz algumas perguntas para ele e o bichinho não soube responder nada.
_ Mentira, compadre! Não acredito!
_ Pois pode acreditar, homem. Tenho tudo aqui na cabeça.
_ Como é seu nome, filho?
_ Me chamam de Neném, seu moço.
_ Você é filho de quem?
_ Sou filho do meu pai e da minha mãe.
_ Onde você mora?
_ Na minha casa.
_ Quantos anos você tem?
_ Eu ainda sou menor de idade.
_Você mora perto de que?
_Moro perto de um prédio que fica do lado da minha casa.
_ O que você tem nessa cabeça, menino?
_ Tenho alguns piolhos, mas minha mãe disse que não era para contar para ninguém.
_Você vai à escola?
_ Vou, mas porque a minha mãe me obriga se não cortam o Bolsa Escola.
_ E o que você estudou, hoje?
_ Hoje eu estudei matemática.
_ Muito bom, então me diga quanto é dois mais dois?
_ Dois mais dois é igual a cinco.
_Como você sabe que está certo?
_ Eu vi esse cálculo no meu facebook.
_ O que você faz quando não está na escola?
_ Eu fico no meu quarto jogando vídeo game. Acessando a internet. Vendo fotos no o meu facebook. Vendo fotos no instagram. Seguindo pessoas no twitter. Atualizando o meu whatsApp e checando os meus e-mails.
_ Você parece ser bem sabido.
_ Minha mãe disse que faço coisas extraordinárias que ela nunca fez no tempo dela.
_ E quantos amiguinhos você tem?
_ Tenho uns dois mil nas minhas redes sociais.
_ Caramba! E amigos de verdade?
_ Além da minha mãe e do meu pai, tenho o Juquinha da minha escola.
_ Seu moço eu estou perdido.
_ Eu sei garoto! Já percebi.
_ E você não tem nada decorado na cabeça como, por exemplo, um número de telefone, o seu endereço completo?
_ Nada. Tá tudo na memória do meu smartphone que minha mãe me deu de presente. Mas a bateria descarregou e agora estou aqui sem saber o que fazer.
_ “E agora, José?”
_ O jeito que encontrei, compadre, foi sair perguntando se alguém conhecia os pais daquele menino. Até que encontrei um senhor, duns setenta anos de idade, que disse que o menino era neto do seu Valdomiro e disse mais. Disse que o menino morava na rua Soriano Pedro, Nº 1100, Bairro Saborá, numa casa amarela, com um portão grande de ferro, com um pé de castanhola bem na frente.
_ Dito e feito, compadre, fui em cima! Não tinha com errar. Então, pensei comigo mesmo. Ô velhinho da cabeça boa. Um homem desses é que é sabido, com a idade que possui ainda tem tudo guardado na memória.
_ E o menino, compadre?
_ O menino, compadre, foi carregar a bateria do celular para ver se não tinha apagado nenhuma informação importante da memória.
Pedro Barros.