O passo
O que me separava dele era um passo. Apenas um passo. Que fazia toda a diferença. Não sei se por caminhar ou por agir, mas era um passo. E agonizava-me. O passo a ser dado era longo. Exigia fôlego, exigia coragem. Não sei se tinha tudo isso, mas arrisquei.
Deu certo.
Não sei se pela coragem ou o fôlego que detive. Mas o medo que tinha de permanecer na mesmice era tamanho que desuni o par de pés e, não como a criança que aprende a andar mas como quem a vida lhe tirou o privilégio e a devolveu em instantes, comecei a andar. Eu conhecia bem essa sensação, mas foi extraordinário.
Sabe, sentir aquela sensação de ter devolvido aquilo que lhe foi tirado injustamente, que lhe tiraram sem o menor esforço e, junto, arrancaram-te a identidade, a vida, deixaram-te apenas existir, sem a mínima vontade de continuar pertencendo a este mundo? Sentir devolvido aquilo que você demorou tanto para reconquistar e, sem saber o que fazia, apenas caminhou, e conseguiste tudo de volta?
Ainda não sei o que aconteceu. Não tinha mais fôlego, nem coragem. Mas foi bom. Caminhei. Como uma pessoa que viveu por anos se movendo por meio de uma cadeira de rodas e, assim, meio que de repente, começa a andar por conta própria, surpreendendo médicos, familiares, amigos, todos à volta.
Nossa, era apenas um passo. Era apenas disso que eu precisara esse tempo todo. Fiz de tudo, e me esqueci de caminhar.
Era apenas um passo. O passo. Quando o dei, ganhei coragem, ganhei fôlego e tudo o mais que eu sempre quis.
E vivi.