Arrependimentos

[...] Novamente ele se olhou no espelho, checou mais de uma vez seus olhos endemoniados, admirou seus pulsos vermelhos de sangue, enquanto sua vida esvaía-se por suas frágeis veias e sua sanidade perdia-se num arrependimento profundo, num flash de memórias acinzentadas.

E quantas vezes ele, por ser tão impuro e detestável como um alguém qualquer não se machucou, não se feriu por escolhas erradas, por situações mal julgadas... Um pobre coitado tachado como vítima de um desespero profano, de um pecado mortal, de uma fraqueza desprezível, uma fragilidade ou um defeito incurável; Quantas vezes não fora vítima de sua própria vida, de seu próprio ser, de seu próprio deus.

Esvai, esvai, cada vez mais se esvai, e de nada adiantaria ficar ali parado enquanto morria, e no fundo de seus olhos molhados e de seu coração amargurado, o pobre desgraçado sabia. Um vilão coitado, banalizado, vítima de si mesmo e agora de sua própria liberdade. "Faz o que tu queres", nunca fora tão amargo, sem "o mal a ninguém causar". Tão sádico é escolher, tão injusto é, tão difícil a inconsequência... De nada adianta agora, aquele amor cego não voltará, aquelas palavras erradas, aqueles atos impuros, os pensamentos egoístas, as ofensas impiedosas, a covardia, a solidão, como se não bastasse ser amaldiçoado, agora a morte... Tudo o que restou. E mais uma se esvai, pelo bem da liberdade, pelo mal da escolha, pela dificuldade de pensar; Nada nunca mais irá voltar, nem mesmo a dura liberdade de viver, nem aquela inocência, aquela ingenuidade... Nem o sonho utópico de sorrir, e nem mesmo sequer o gosto horrível de amar.

Era a dita liberdade, aquela escrita em cores mortas com giz vermelho-vida no espelho borrado, aquela frase que nunca esquecerá e que última terá a chance de ler:

"Nada nunca mais irá voltar. Nunca volta."

Lucas Häkkan
Enviado por Lucas Häkkan em 02/10/2015
Reeditado em 03/10/2015
Código do texto: T5402440
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