O homem dos cinco alqueires – Parte II
Todos na família têm histórias estranham para contar sobre as aparições do homem dos cinco alqueires, que, diga-se de passagem nem sempre “aparecia” com voz de homem... Ninguém nunca o viu... Mas, ouviram suas conversas, ou o que pareciam ser conversas, já que nunca dava para entender completamente o que ele dizia... a impressão era que ele caminhava conversando com alguém, mas apenas a voz dele era ouvida... De forma compassada, como se explicasse calmamente algo... Apenas uma ou outra palavra podia ser entendida...
Até eu tive uma experiência com o homem dos cinco alqueires... Aconteceu após uns dois anos depois que me mudei para o sítio, meu sogro, meu marido e os irmãos dele estavam na roça nos cinco alqueires... Outra plantação de arroz... Desta vez quem foi levar o almoço fui eu. Já ouvira muitas histórias do homem dos cinco alqueires, mas, para falar a verdade, não acreditava naquilo! Fui criada na cidade e estas histórias eram apenas histórias. Gostava de ir sozinha para a roça, era um momento só meu... O contato com a natureza, o cheiro gostoso da roça de café... O som dos pássaros... Gostava de molhar os pés no pequeno riacho que ficava entre a plantação de cacau e a de café... Mas, foi neste dia que minha opinião sobre o homem dos cinco alqueires mudou. Naquela época, minha cunhada cuidava do gado de leite. Era ela quem apartava os bezerros todas as tardes, os prendia no curral para tirar o leite logo de madrugada... Eu achava minha cunhada muito corajosa! Particularmente tinha medo das vacas! Já levei muitas carreiras e queria distancias das “mimosas”. Interessante, que o costume na hora de apartar os bezerros é chamá-los aos gritos... “Oooouuuu! Ou! Ou! Ou! Aaaeeee... ou! Ou! Oooouuu!” era mais ou menos assim que minha cunhada chamava os bezerros... E eles vinham! Vinham as vacas com seus bezerrinhos em fila para o curral... Bonito de se ver! O mais interessante é que cada vaqueiro (a) tem um jeito diferente para chamar o gado... E o gado se acostuma com seu vaqueiro (a) e obedece ao chamado...
Pois bem, levei o almoço e me demorei um pouco na roça... Gostava de subir nos troncos das árvores e ficar olhando a plantação de arroz... Já viram como é bonito uma plantação de arroz? E o cheiro! Tem um cheiro gostoso, característico! A cor é bonita... O contraste do brilho do sol nas folhas e nos cachos de arroz é bonito... Tudo aquilo era novidade para mim e me encantava! Então, depois que os rapazes almoçaram, fiquei por lá por algum tempo... Eles retornaram ao trabalho e eu tomei o caminho de volta para casa... Meu cunhado ainda brincou – cuidado com o homem dos cinco alqueires! Rimos e iniciei minha jornada de volta para casa.
Antes de entrar na plantação de cacau, o tempo começou a mudar muito rapidamente... Vinha chuva grossa por aí... Mas, não aprecei o passo... Gostava de banho de chuva.
Estava quase saindo da plantação de cacau quando a chuva começou a cair... Forte, pingos grossos que doíam na pele... Mas, não havia vento, o que era bom... Atravessei a porteira e entrei no pasto, estava perto de casa. Foi ai que ouvi os gritos de minha cunhada apartando o gado... “Oooouuuu! Ou! Ou! Ou! Aaaeeee... ou! Ou! Oooouuu!” e de novo... “Oooouuuu! Ou! Ou! Ou! Aaaeeee... ou! Ou! Oooouuu!” olhei em direção aos gritos e não a vi... Havia um declive e daquela distancia não seria possível vê-la. Gritei de volta – Eita! Mulher corajosa, apartando bezerro embaixo de chuva! Vamo pra casaaaa!!!! Em resposta escutei apenas os gritos dela - “Oooouuuu! Ou! Ou! Ou! Aaaeeee... ou! Ou! Oooouuu!” Imaginei que ela não havia me escutado... Continuei meu caminho para casa... Como a porta dos fundos estava fechada, segui para a varanda da frente, imaginei que minha sogra estaria por lá. E qual não foi minha surpresa quando avistei minha cunhada seca e linda sentada na varanda conversando com minha sogra! Olhei para ela e falei – “Uai, Neiva, você não estava apartando bezerros?” ao que ela me respondeu espantada – “Tá louca que vou apartar bezerros com uma chuva dessas?” Eu contei que a ouvi apartando os bezerros perto da plantação de cacau e que até brinquei com ela...
Neiva se arrepiou todinha e disse – “Credo! Você ouviu foi o homem dos cinco alqueires!”
Num falei nada... Mas, que foi esquisito, ah! Isso foi!