Guerra dos Sexos V - Matemática

Guerra dos Sexos V - Matemática

PI = 3, 14159265358979323846... A razão entre o perímetro de um círculo e o seu diâmetro produz o número PI. A principal curiosidade, no caso do PI, é a obtenção de um valor sempre igual e constante, adicionando-se também um mistério: o de não podermos conhecer a última casa. Mas Fernando pensava ter encontrado uma estranha relação entre essa constante matemática e as garotas, especialmente Patrícia, sua colega de sala de aula. De cara, ambos eram misteriosos, pensava Fernando. O PI, naquela sua sequência numérica sem fim, era tão inescrutável quanto sua colega de escola. Ela era uma bonita garota. Mas Fernando não conseguia manter um diálogo com ela, que não fossem sobre matéria escolar. Ele a achava distante, inatingível. De qualquer forma, ele usava sua relativa habilidade na matemática, aliada a uma excelente memória, para impressionar os demais colegas. Estudante de ensino médio, em plena adolescência, ele já descobrira o interesse pelas garotas. Em vão. Elas o viam apenas como mais um CDF, aqueles meninos chatos que sabiam tudo de ciências, mas eram incapazes de pronunciar uma frase que fizesse sentido para uma garota.

Carente de atributos físicos e habilidades sociais, que o diferenciasse, ele imaginava que poderia melhorar sua imagem através da matemática. Assim, ele era capaz de escrever ou falar, de memória, o número PI, até a vigésima casa decimal, depois da vírgula. Fazia contas de cabeça, tinha extrema facilidade de resolver problemas aritméticos, contornando equações, vencendo algoritmos, subjugando frações, domesticando catetos e hipotenusas. Era o primeiro escolhido, na formação de grupos de estudo. Se era um sucesso juntos aos colegas do fundo da sala, aqueles que até passam no ano, mas não estudam, Fernando estava longe de impressionar as meninas. Só recorriam a ele para solucionar problemas, de... matemática. Nada mais. E o ano escolar transcorria, em sua marcha lenta e inexorável. Fernando acumulando notas 10, nas provas, e notas 0 na plateia feminina. Mas, com o tempo, ele se cansou de procurar uma resposta, na matemática, para sua dificuldade com as meninas. Concluiu, que mulheres e matemática, não tinham qualquer semelhança, em termos abstratos, e nem guardavam qualquer correspondência no que tange à previsibilidade. Ele nunca se decepcionava com a matemática. Sempre encontrava algo lógico, no final das contas. Quanto às meninas... Já não tinha tantas esperanças.

Era dia de prova do professor Ivo. Antigo professor de matemática, ainda insistia em preguiçosas aulas expositivas. Aferrado a antigas práticas, suas provas eram um verdadeiro museu de armadilhas. Jamais ele utilizava, nas questões da prova, de exercícios já estudados anteriormente. Ele sempre acrescentava seu toque, dificultando, complicando, quase inviabilizando a busca da solução. Não para Fernando, que facilmente reconhecia as cascas de banana colocadas pelo professor. Mas Patrícia, sentada ao lado de Fernando, era acometida de verdadeiro terror, diante de tão incompreensíveis questões. Restava-lhe olhar, discretamente, a prova de Fernando, buscando, como um náufrago boiando no mar, algum bote à deriva, para, milagrosamente, se agarrar. Fernando sentiu aquele olhar desesperado. Cansado de sempre salvar a bonita colega, naquele dia ele mudou de atitude. Encobriu, com os braços, a prova. Patrícia ficou a ver navios. A sua nota foi um desastre. Assim como sua relação com Fernando.

- Porque você não me deixou em ver sua prova? – Patrícia falou como se aquilo fosse um direito adquirido.

- Patrícia, esta é a quinta prova de matemática. Nas outras quatro, em vez de estudar, você preferiu copiar meus resultados. Não acha que, se alguém deve alguma coisa aqui, este alguém é você? – Patrícia ficou atônita com a clareza do colega.

- Sim, claro... desculpe. Mas você podia ter me falado antes. Assim eu poderia ter me preparado melhor – Retrucou uma Patrícia cheia de culpa.

- Na verdade eu já falei, mas você nunca me escutou. Você sempre me viu como solução para sua prova, não como alguém que possa ser ouvido, levando em conta – Patrícia engoliu, em seco, aquela bordoada. Ficou sem palavras, murmurou um pedido de desculpas e se afastou.

Fernando, no íntimo pensou que nunca mais teria uma chance com uma garota, agora que ele resolvera não mais impressionar ninguém. Sim, ele gostou de, finalmente, deixar de ser apenas o legalzinho da turma, agora ele seria ele mesmo. Até o final do ano, ele seguiu essa postura. Na dele, fazendo sua parte, mas não entregando nada de bandeja pra ninguém. Sua vida, de fato, mudou. Mas, ao contrário do que ele previa, mudou para melhor. Tudo aquilo que ele sonhara, acabou acontecendo, a partir do momento que parou de fazer concessões.

No último mês do ano letivo, Fernando estava em casa quando a campainha tocou. Ele atendeu. Patrícia, sua namorada, chegara. Eles se beijaram, trocaram algumas palavras, e foram estudar. Agora Patrícia tirava boas notas em matemática graças a si mesma. O namorado ainda ajudava, mas cola, nunca mais.

Pequiboy
Enviado por Pequiboy em 14/04/2015
Reeditado em 14/04/2015
Código do texto: T5206377
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