Sem nome, sem registro, sem identidade.
Hoje, por volta das duas e trinta da manhã, no Bairro Santa Fé. No cruzamento da Rua Projetada com a Rua Sem Prefeito, S/N. Deu cria a puta Maria. A criança pesando dois quilos e cinquenta centímetros. De iniciais A. H. E. dos Santos de apenas poucas horas de vida. A mesma foi deixada na porta da senhora Socorro ainda ensanguentada, apenas enrolada pelo cordão umbilical. “Quando eu acordei foi com o barulho dos cachorros latindo e um barulho de criança chorando. Até pensei que fosse o filho da vizinha, mas o choro vinha bem da porta. Fiquei assustada. Chamei o meu esposo e fomos ver o que era. Para nossa surpresa era um bebê”. Conta dona Socorro.
O filho da puta que nasceu hoje teve muita sorte. Se não vejamos. Ele poderia ter nascido morto, por exemplo. Ou os cães poderiam tê-lo devorado. E se a Maria tivesse decidido jogá-lo do Gritador. É por isso que se diz que vida boa é as dos outros. Enquanto você está lendo este texto muitos filhos da puta estão nascendo no mundo, inclusive aqui, em Pedro II. Agora, imagine quantos filhos da mãe que tiveram uma sorte diferente, que não nasceram indigentes, estão reclamando da sorte e muitas vezes pedindo à morte, que venha. Que nasceram em berço de ouro com quarto todo enfeitado com pai e mãe ao seu lado chorando de emoção. Enquanto o filho da puta não teve teto nem nada, só uma calçada enlameada e como cobertor a cruviana, sob a luz das estrelas. E você pode me dizer, “e o que eu tenho a ver com isso”, nada. E pode dizer mais ainda, “esse filho da puta não é nada meu. A mãe desse filho da puta foi quem escolheu a vida que tem”.
Então dê graças a Deus por ser bom cristão, por estender a sua mão e repartir o pão com quem precisa. Que Deus lhe dê sempre em dobro a bondade que você compartilha com o próximo filho da puta que bater a sua porta a qualquer hora. Será sorte ou azar quando um filho da puta entra na minha casa, entra na minha vida. Porque o que se percebe aqui em Pedro II, como em qualquer lugar do mundo é o aumento dos filhos órfãos de pai e mãe. E até os que têm pai e mãe, os mesmos, já estão sendo entregue ao mundo e com isso a estrutura familiar vai sendo descaracterizada. É homem com homem virando lobisomem, mulher com mulher virando jacaré, apenas um dos dois, cachorro com gato, só para variar. É uma apologia terrível na mídia em geral, sendo tudo normal o Zé fazer o papel de mulher. “O mundo hoje está louco, porque no meu tempo era tudo diferente ou será que quem está enlouquecendo sou eu”, diz seu Chico assustado com o que presenciava na casa da vizinha.
São os tempos modernos! E a culpa é de quem? De ninguém. Pois, o filho da puta nem o nome no cartório tem. O único registro de nascimento do filho da puta que nasceu hoje consta nestas poucas linhas com o nome de Ainda Há Esperança dos Santos, nascido no primeiro dia do mês de abril do ano de dois mil e sete, de cor parda, filho de Maria e pai ignorado.
Pedro Barros.