#Partiu...

Eles eram todos amigos.... dessas amizades que não há mais visita ou abraço, mas que permanece viva por curtidas em redes sociais. Dessas amizades que um mostra o que está comendo no café da manhã, outro exibe o ingresso do próximo show que irá assistir, e o outro usa a antiga cerquilha ou jogo da velha – hoje revestida de “hashtag” – para narrar cada passo de seu dia “feliz”. #Partiu academia, #partiu restaurante, #partiu cursinho, #partiu pqp!

Ser feliz, mostrar-se feliz, convencer a todos de que é feliz... “veja como sou feliz!” – diz cada hashtag. E é disto que a rede de “amigos” está cheia. Amigos que não se conhecem de verdade, que passam na rua e olham um para o outro com aquela sensação de “Acho que já vi esse cara em algum lugar... Ah, sim, ele faz parte da minha rede social! Será que digo “oi”? Melhor não, a gente nem se conhece... vai pegar mal... mas depois eu curto uma foto dele e fica tudo bem!”

E nesta competição de quem é mais feliz – virtualmente falando (ou teclando) – a inveja é o carro chefe. Invejar ou fazer invejar. E é aí que entra a Carol, a Bibi, a Duda, a Cris... e outros nomes simpáticos para meninas que se vestem de forma igual, cortam o cabelo igual, ouvem as mesmas músicas... uma multidão de iguais, fazendo as mesmas coisas e tentando ser mais feliz que a outra. O mesmo com os muitos Betos, Luizinhos e Marcelos.

E os iguais curtem, navegam, espiam, compartilham e... invejam! É claro que Carol também gostaria de poder ir para a academia como a Bibi, e Beto também queria ir para aquele restaurante caro igual o Luiz; e claro, para New York, Orlando, London...

Opa, Duda percebeu que Beth não tem postado muito ultimamente. Beth era campeã de felicidade virtual! Beth e o maridão, Beth no parque, Beth na praia, Beth na fazenda, Beth comprando um carro novo, Beth fazendo as malas, Beth, Beth, Beth... mas agora Beth sumiu.

“Beth deve estar em Buenos Aires, ou em Paris” – já deduziu a Duda, aguardando para ver as fotos em breve. Mas o que nenhum amigo do peito sabe, nem mesmo a Carol, a Duda, a Cris ou a Bibi; é que Beth está internada há mais de vinte dias. Beth adoeceu, teve pneumonia, passou pela UTI, pegou uma bactéria no hospital... Beth ainda apresenta quadro febril, infecção... sua família se reveza para visitá-la diariamente, mas mesmo assim Beth está deprimida, já quase desistindo de viver...

E onde estão os amigos para animá-la? Na Internet, é claro! Continuam curtindo, compartilhando, navegando, espiando, invejando as aparências... Sem nem imaginar a verdade e a solidão por trás de cada hashtag.

Hoje é fácil acompanhar de longe, curtir, ostentar ou desejar na solidão cibernética... difícil é ser presente, criar laços verdadeiros, oferecer ouvidos e ombros amigos; olhar além, desconectar, sair de casa e ir ao encontro de alguém que não está no “Mundo da Magia”, mas sim, precisando de companhia verdadeira, destas que não compartilham frases prontas de auto-ajuda, mas que oferecem uma conversa animada, conselhos e presença real; destas que não curtem suas fotos, mas que eternizam momentos mágicos em nossa memória.

Hoje o que parece bom todo mundo ostenta e inveja; e o que é real fica escondido como um tesouro, para aqueles poucos que souberem buscar, explorar e valorizar a verdadeira amizade.

Lady J
Enviado por Lady J em 16/12/2014
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