RESPEITÁVEL FULIGEM
Solidão é um trem que vai e volta vazio sem ponto final. Não para nas estações e nem tampouco precisa ser reabastecido, seja do que for. Como zumbi nômade, não entende porque nunca chega num destino, acho que nem sabe o que é destino. Tem vezes que empaca e aí não há alma que o faça mover um milimetro sequer. Nessa horas, fica em estado de contemplação, atado à um nirvana surrado. Simplesmente mergulha nessa gosma dita consciência e vira um serelepe ser com sangue destravando suas veias e fôlego encapuzado - como o meu,como o seu. Então, esquece suas senhas e querelas de falastrão e vira rei. Ou réu, dependendo de quem estiver na plateia. Solidão é banha derrapada, mácula mágica das berebas aflitas do medo, como o meu, como o seu. Esqueça aquela fala que tentou decorar em vão. Esqueça de querer fazer essa pilastra rosnar, esse fardo que faz você timbre. Esqueça de ser vil, servil, funil. Esqueça os bemóis remendados que entende por paixão. Esqueça tudo. Nesse trem oco e desembestado, só caberão nós dois e nada mais. Se acomode, ajeite sua respeitável fuligem num canto qualquer e espere zarpar daqui. Sua solidão é o arremate da minha, sem ela não posso me tecer à vida, nem ao que for. Sem a sua solidão avessa e tão vadia, meus suspensórios de seda ficarão sem graça, falando sozinhos para um ninguém eterno. Vamos juntos nessa golfada pelos escuros das nossas varandas. Me entregue sua mão e vamos nessa, simbora, irmão. Que os ventos sejam farsantes o suficiente para que você não perceba essa colcha rechonchuda chamada solidão. A mesma solidão que, certa vez, fiz brotar da sua vértebra mais louca. Agora não dá mais para voltar para casa. Nosso indigesto fogaréu esperou demais pelo seu rasante afago. Agora é tarde demais, Tarde demais para tudo.
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