Domingo

Crônica

O intelectual e o homem simplório possuem suas altas questões, quero dizer, suas indagações que demandam significativos esforços especulativos. Todavia, elas diferenciam-se em demasia. O Intelectual se questiona: Capitalismo ou Socialismo? Impressionismo ou Expressionismo? Chopin ou Louis Armstrong? Etc. O homem simplório, por sua vez, deposita em tais questões todo o seu vigor intelectivo: Há um ser superior ou não? Serei feliz? A casa antes do carro ou carro antes da casa? Etc.

No que tange às questões diminutas, todavia, seja para o intelectual seja para o homem simplório, a ambos lhes ocorre uma ao término do final de semana: Por qual razão o domingo começa alegre e termina triste?

Por ora omito-me de responder a questão e deixo-a a cargo dos tipos mais imparciais e menos idealistas. Empenho-me, contudo, em reforçar a tese de que o domingo começa alegre e termina triste. O meu foi assim hoje.

Tal como em diversas outras, tivemos aqui em casa um aprazível almoço em família com crianças sobrecarregando o ambiente de leveza, bondade e inocência. A comida, a bebida estavam ótimas, contudo foram e são apenas desculpas para reunirmos-nos, para ver e sentir a existência daqueles que amamos, mesmo que isso não se traduza em palavras e afagos. Nos reunirmos, estarmos juntos tornou-nos e torna o domingo, em parte, um dia alegre e festivo.

Quando todos vão embora, contudo, quando não há mais aquele emaranhado de vozes, risos, quando a noite começa a cair e quando percebemos que a música de fundo que antes dominava o ambiente fora substituída pela execrável vinheta do semanal Fantástico, somos então invadidos por uma melancolia, por um abatimento que se contradiz com tudo aquilo que sentíramos mais cedo. Rostos risonhos cedem lugar a faces taciturnas, a faces inquietas. Ao invés de acreditarmos que vivemos em um “mundo” naturalmente alegre que passa por momentos tristes passamos a acreditar que vivemos em um “mundo” naturalmente triste que possui seus momentos de alegria.

O domingo, portanto, nos evidencia os dois “mundos” que a nós é possível experienciar, quais sejam, o “mundo" naturalmente alegre que possui seus momentos tristes e o “mundo” naturalmente triste que possui seus momentos de alegria ( se assim os entendêssemos também não seria nenhum equivoco da nossa parte: o “mundo” naturalmente pacífico que possui seus momentos de violência e o “mundo” naturalmente violento que possui seus momentos de pacificidade).

Rafael Oliveira, Florianópolis 2014.

RAFA PASSANT
Enviado por RAFA PASSANT em 02/11/2014
Reeditado em 02/11/2014
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