VIOLINO-POESIA E RABECA-POEMA


Um poema é aquela poesia que queria que fosse uma rosa para lhe ofertar.
Escolhi a nossa cor predileta - a amarela - das pétalas mais aveludadas que pude conceber; mas meu poema não é uma rosa. Tentará ser sempre um lírio, dos mais belos do jardim. Mas sei que você adora os lírios também...

Assim fiquei pensando, em não “tocar” poesia, por não sabê-las dedilhar, não acertar sua afinação... Com isto, veio-me à lembrança uma frustração dos tempos da adolescência. Por mais de três anos tentei ser um violinista, onde o meu violino era a minha grande poesia. Mas não consegui dominá-lo. Ele também me recusou de todos os modos. Não nos demos bem. Parecia que ele me dizia; "Vá para os teclados", e eu até quase que ouvia essa voz!

O “Príncipe dos Instrumentos”, sem o qual não existe sinfonia que evoque a beleza e a magia que só ele produz, não me aceitou como amigo fiel.

Todos os instrumentos são importantes, mas ele é inigualável.
Sou um violinista frustrado. Mas francamente o que são três anos e tanto, frente aos doze anos para seu aprendizado? Além das especializações experimentos e técnicas das muitas possibilidades instrumentais, conhecer seus irmãos de nova geração: os elétricos de cinco cordas, não só as quatro fundamentais, mi, lá, ré e sol. E os estudos diários, para sempre.

Meu querido violino de madeira vermelha, modelo antigo...
Não resistindo mais ver seu corpo sem alma, depositado em sua “caixa-ataúde” o doei a um aluno carente, lamentando profundamente sua despedida, seu adeus; não a minha atitude.

Foi embora com ele, boa parte da poesia que existia em mim. A música é a roupa de gala de todas as poesias. Ficou um vazio que precisava ser preenchido, como viver a vida sem um amor ao menos parecido? Vão-se as paixões ficam as ilusões. Sonhos sonhados e não realizados. Desejos e amores não almejados.

Estudando as histórias infantis mais a fundo, perscrutá-las com olhos e sentimentos aguçados, veremos que inúmeras têm um grande poder formativo e indutivo latente - psicodidático: quanto mais for o vetor de sua emissão e nossa captação em ver neles o “ensinando a aprender”.

A história, “O pobre menino violinista”, tocando nas esquinas de um tempo barroco, para ganhar umas moedas e levá-las para casa ajudar a sua mãezinha... Foi (hoje analisando pela psicodidática), uma história que mamãe me contava, como recurso comovente de convencimento a deixá-la pelo seu gosto, a matricular-me no Conservatório Musical; trocando o futebol no “Campinho da Enxada” e a natação no “Tancão” - represamento de um riacho - pelas três “infindáveis” horas de violino diárias, menos o domingo e “dias santos”. Mais ainda, as lições trazidas para casa. Depois, tomei gosto. Até ia ter aulas de reforço com o maestro Vicente Muniz que regia sua orquestra homônima.

Por que esta crônica inclui a história de um violino? Porque não produzo poesias da mesma maneira que não faço música. Sou um teórico, um músico frustrado, como se pela minha vida tivesse passado um grande amor não correspondido.

Para acalmar a frustração fui à Iguape. Lá se fazem legítimas rabecas – de forma artesanal. As mesmas usadas nas Festas do Divino (Espírito Santo), padroeiro da cidade. Encantei-me por elas.

Comprei minha rabeca-poema. Ela não é tocada do mesmo jeito, nem possui o mesmo som agudo do violino-poesia. Toca-se apoiada ao peito. Seu som fanhoso mais parece um lamento tristonho saído do fundo da alma. Alma que não necessariamente sofre por amor ou dor, apenas vive por uma fé, no dançar e cantar desse povo simples, caiçaras, autodidatas que elevam aos céus seu canto-poema.

Como disse Cecília Meirelles: “Não sou alegre nem sou triste: sou poeta”. Não toco violino-poesia; tento tocar rabeca-poema.
Mauro Martins Santos
Enviado por Mauro Martins Santos em 17/09/2014
Reeditado em 25/09/2015
Código do texto: T4964930
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