Matinada

Hoje pela manhã fui ao lago. Há alguns dias faço isso e sinto que é bom. Desço do carro, alongo-me e caminho. Poderia caminhar na trilha, mas lá não há o cheiro do eucalipto, a água, os patos, a neblina, um lugar para a reflexão. Caminhando em volta do lago,sinto que faço parte do lugar e me sinto inserida no meio das pessoas que cruzam meu caminho ou que vão na mesma direção que eu.

Enquanto caminho, alongo-me. Reservo os últimos minutos para de novo me alongar. Paro num quiosque onde há uma viga em que posso me dependurar, outra onde coloco os pés, como numa barra de academia; fico vendo a água, imersa no silêncio da manhã e nos meus pensamentos. Sinto que sou privilegiada por ter essas coisas e louvo a Deus pela vida.

Hoje, em especial , pensei no quanto as pessoas já me alertaram para a minha tensão nos ombros, nas costas e em quanta tensão já percebi através de vídeos, em que apareço levando pratos, talheres, panos, ou falando com as pessoas em reuniões familiares. Movimentos lentos, que a olhos mais descuidados se confundem com relaxamento e calma interior; tenho, no entanto, consciência de que esses são valores que devo buscar sempre; por isso a recorrente preferência que dou nesses dias ao lago.

Depois, por associação de idéias, refleti ainda sobre os relacionamentos humanos. À medida que nos saudávamos, eu e as pessoas, de passos rápidos, lembrei-me de certa vez ter estado num centro de tratamentos naturais e de ter visto pessoas que não olhavam e não se deixavam olhar nos olhos quando saudavam as outras. Então pensei também em pessoas que, ao cumprimentarem, oferecem quase tão-somente as pontas dos dedos; outras que, ao abraçarem, não se envolvem, e a confraternização sai interrompida.

Incrível isso de precisarmos reaprender gestos naturais, envolventes,calorosos,ternos,soltos, lânguidos; gestos recíprocos de nos olharmos nos olhos, de nos abraçarmos, de nos tocarmos, de baixarmos a guarda, de nos envolvermos, de permitirmos ser quem somos, de nos curarmos de tantas afecções do corpo e da alma!

Neusa Storti Guerra Jacintho
Enviado por Neusa Storti Guerra Jacintho em 18/05/2007
Reeditado em 12/11/2009
Código do texto: T491638
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