Entre Máscaras e Silicone
Entre marchinhas, euforias e serpentinas, eu seguia com o olhar minha Colombina. Sua máscara não me deixava ver os trejeitos faciais, mas o corpo atormentava meu falo ansioso. Contornos abundantes, nádegas vultosas, arredondadas, sobrando nas roupas justas e se contorcendo ao som dos metais de carnaval. Uma visão de outro mundo, de outro reino, de outros deuses. Alí, em meio aos brilhos e amores passageiros, um deus priápico comandava meus pecados; seguindo outras regras: “Não desejeis a mulher do próximo quando este estiver próximo”!
Dançando e cantando no salão, era desejada por todos. Um beijo suado, doado a cada boca que a procurava. Eu aguardava pacientemente a minha vez. Mas Colombina esnobava minha ansiedade. Naquela noite, suas mãos macias apenas tocaram de leve meu priapismo nervoso. “Droga, só isso!” Pensei e quase me conformei. Quem sabe ela não me procuraria mais tarde, no clarear da aurora, no último gole que quebra a timidez... Na útima fanfarrice do último “tostão” de um estudante metido a esperto, liso e sonhando com sua amada. Mas, ao silenciar da orquestra, lá estava ela – novamente - com seu Arlequim apaixonado.
Antiga disputa entre jovens imberbes, dois serviçais do mundo, uma só mulher; também serviçal do amor. Triângulo perfeito para uma “Commedia dell’Arte” de carnaval. Com quem ela ficaria de vez até o final da festa momesca? Comigo, o mais pobre dos serviçais, fantasiado de Pierrô, inconformado e apaixonado, ou com seu debochado e esperto amado de todo final de noite?
Ja se tinha ido mais da metade dos bailes de carnaval. A mesma orquestra, o mesmo repertório: “mamãe eu quero, mamãe eu quero...” Naquela noite, fiz ponto de coveiro: na porta do banheiro das muheres. Para meu desespero, não a vi entrar. Talvez dançando, pulando... Sem fazer “xixi”? Eu, ansioso e quase molhando as calças de cetim, firme para não perder o ponto. A noite foi cansando, o Arlequim de ontem já se ia; bêbado, sozinho e gritando palavras desconexas: “Aquele filho duma puta... Ah! Se eu te pego” – Quem sabe, efeito da bebida.
Enfim, a última noite de carnaval. Logo de cara, o amado da minha Colombina mais uma vez totalmente embriagado. Talvez, a minha chance. A orquestra já cansada do mesmo repertório, muitos não mais pulavam; preocupação com o amanhã, a rotina das cinzas. Eu, ainda não! Minha fogueira continuava ardendo incessantemente.
Encontrei-a com os olhos, veio no meu rumo, os mesmos contornos, a mesma máscara. Minhas velhas intenções começaram a pulsar de ansiedade: “Até que enfim, no apagar das luzes.” Um canto qualquer, um abraço, um amasso... O chão seria o limite! Enquanto ela tirava a máscara à minha frente, a voz saiu com um grave meloso, improvisada sob os trejeitos de uma sexualidade momentânea:
- E aí Pierrô,... Tá disponível?
A pintura do meu rosto quase saltava fora enquanto o deus priápico despencava para seu descanso de quarta-feira de cinzas.
- Pora, cara... Tú é homem! Se esqueceu até de fazer a barba... – Não esperei o “Colombino” falar. dei no pé! Lá se foi mais um carnaval sem minha Colombina.
Na próxima folia, mudo de fantasia!