Verônica

Um tímido raio de sol entrava pela janela entreaberta da sala, fazendo com que seus óculos refletissem de uma maneira que seus olhos não podiam ser vistos. E seus olhos enxergavam apenas uma coisa, em meio ao murmúrio das mais de 50 pessoas presentes no recinto: Verônica, a “Morena”, como era carinhosamente chamada por seus amigos mais íntimos.

Ela era a melhor estudante da sala. Sempre ocupava posições de liderança nas discussões do grêmio estudantil; seu corpo era de uma Vênus com braços, seu rosto era suavemente redondo, com o olhar de uma criança. Seu admirador secreto, à distância e enrustido com uma vergonhosa aparência de óculos, trejeitos amplos e de “nerd”, observava-a, sem nada fazer. Apenas o silêncio restava para o pobre infeliz, enquanto sua paixão era alvo de elogios e estava sempre cercada de amigos –e de pretendentes-.

O professor Cacá, de história, propôs uma pesquisa em grupo, cujo tema era Mitologia Grega. Por sorteio, formou equipes de três elementos. O rapaz, com muita vergonha, foi indicado para formar grupo com Maria Eduarda e Verônica. De tantos projetos que já participou, pensou: “finalmente eu caí no grupo dela.” Foi o necessário para alterar seu humor drasticamente.

-Nos encontraremos na minha casa, logo depois do almoço, pra gente fazer a pesquisa!- disse a morena. A princípio, os olhos verdes de Verônica fitaram os do rapaz através das lentes de grau 3,5. Ela escreveu seu endereço e entregou o papel para o jovem, que apenas respondeu com um ok e um breve sorriso. Mesmo sem mostrar, estava completamente entusiasmado apenas pelo fato de poder passar um tempo com a menina, num local fora da escola.

Ao chegar a casa, notou a mesma bagunça de sempre: sua mãe, um pouco desengonçada preparando o almoço em cima da hora e seu pai, obviamente trabalhando, não tinha dado notícias desde que saiu. Seu irmão mais novo chorava, e o mais velho, dormia no sofá. Almoçou, pegou seu material e saiu a pé atrás do endereço.

“Rua Cássia Fortes, Bairro das Rosas, 145”. O papel já amassado indicava esse local e, num tempo onde não existia internet, o estudante teve de procurar sozinho. Indicou-se com os transeuntes e acabou por descobrir que a casa da garota era do outro lado da cidade, a praticamente dois quilômetros da sua. E andou durante meia hora em passo acelerado, até chegar no bairro. Só que, entre tantas ruas, qual seria a correta? Teve de passar em cada uma, vendo os nomes nos postes. E para seu azar (que por sinal era seu melhor amigo) a rua era a oitava de dez, nos limites do quarteirão. Ao finalmente situar-se na rua certa, notou que as casas eram enormes. Quase mansões, classe média alta.

A calçada, embora antiga, era muito bem conservada. Enquanto andava observando tudo menos o que estava à sua frente, nos seu momento de distração, esbarrou numa mulher, que pediu desculpas e saiu com pressa.

Ao ver o número 145 num dos altos muros, sua pulsação aumentou e sentiu calafrios. Aproximou-se do imponente portão de madeira e humildemente bateu palmas. Em pouco tempo, Verônica foi ao seu encontro e abriu a porta. Estava lindamente vestida com uma regata florida, uma pulseira artesanal, curto shorts e chinelos. O tempo congelou para o rapaz. Vendo aquela voluptuosa mulher diante de si, ficou sem reação. Só voltou à realidade quando ouviu:

-Você está atrasado! Não sabe olhar as horas?- e já tratou de arranjar uma desculpa:

-Eu moro longe e tive que vir a pé.

-Percebe-se! Está suado! Entre, mas não encoste nos móveis. Que eu vou buscar um copo d’água e uma camiseta para que você possa sentar nas cadeiras do meu pai...

A casa era simplesmente um encanto. Tinha um jardim ornamental, peixes ornamentais, rochas ornamentais, tudo que fosse ornamental tinha na casa de Verônica. Pássaros bebiam água numa pequena fonte antes da porta de entrada. Na garagem, tinham dois carros: um Opala e um jipe Land Rover, além de motos e bonitas bicicletas. Tudo aquilo era muito estranho. Para quem encontra numa miserável realidade de desunião familiar, chacota na escola e esperança de mudar de vida... Aquilo era algo impossível, coisa de filme.

Ao adentrar na residência, outra surpresa: o ambiente estava a uma temperatura fresca e extremamente agradável, diferente dos 28ºC do lado de fora. Os detalhes todos em mármore não escondiam o dinheiro da família: a menina era muito rica. Um tapete persa situava-se bem no centro da sala, cercado por três sofás de couro espaçosos. Televisão em cima da lareira. Uma escada e muitos caminhos, que davam sei lá onde. O copo de água já esperava para ser bebido em cima do aparador ao lado da porta de entrada. Com muita sede, o cansado bebeu tudo. Sem demora, a jovem desceu as escadas com uma das camisetas de seu pai, obviamente uma das que ele apenas usaria nos finais de semana.

-Vista isso e depois venha comigo até a sala de jantar, poderemos fazer nossa pesquisa lá.

Não mais ofegante e vestido com roupa enxuta, sentou-se na mesa ao lado da moçoila, todo felizinho. Dezesseis exemplares da Enciclopédia Jackson, de A à Z, descansavam ao chão. Verônica disse que Maria Eduarda havia lhe ligado, esclarecendo que não viria, por motivos de força maior (viagem). Ao abrir o exemplar contendo a letra G de Grécia, um pouco confusa e sem experiência com livros complicados, penou um pouco até encontrar o subtítulo Mitologia. Muitas informações impressas, difícil mais para escrever sozinha, pois pensou em fazer metade e deixar a outra metade com o quase mudo colega.

-Cícero, me ajude aqui, não consigo encontrar quem foi Hera.

Instantaneamente, Cícero estava colado com ela, colaborando com a procura. E assim procedeu-se a pesquisa, até o anoitecer. Ao olhar para a janela e perceber que já não havia mais luz natural, Cícero disse que eles tinham que parar e que ele deveria voltar para casa. Só que acabou perdendo a hora, e já não podia mais voltar a pé. Nisso, o pai de Verônica chegou e, ao ficar a par dos acontecimentos, ofereceu uma carona para o menino. Este foi obrigado a aceitar. Despediu-se da amada recebendo um beijo no rosto, e Seu Carlos o levou até sua casa. Cícero agradeceu, e adentrou sua humilde moradia. Foi dormir pensando que, mesmo tendo passado um tempo relativamente curto com a mulher de seus sonhos, estava profundamente contente. Foi a primeira noite daquele ano que o infeliz dormiu calmo.

O dia seguinte na escola estadual Professor Roberto Vidigal foi rápido. Logo na entrada, Verônica já foi interpelando-o, que se beliscava para saber se tudo aquilo não era um sonho diferente dos que já teve. As horas passaram rápido, e ela propôs que eles fossem juntos direto da escola para a casa finalizar a pesquisa. Cícero não percebeu (mas eu percebi porque eu sou o narrador desta história) que Verônica tinha simpatizado com ele, e estava dando-lhe atenção. Entrou no terceiro carro do pai (no caso, um Mercedes-Benz) e foi junto dela até a “mansão”. Logo ao chegarem, seu pai saiu novamente para trabalhar, sem nem almoçar.Cícero teve a melhor refeição da sua vida naquele dia: Lasanha com macarronada em plena quinta-feira.

Depois do almoço, já aprontaram novamente o material de estudo, e ao trabalho tornaram. Entretanto, a pesquisa a ser concluída era breve, apenas alguns detalhes e bibliografia. Mediante essa situação, Cícero humildemente arrumou suas coisas e despediu-se à distância. Verônica rapidamente exclamou:

-Fique! Eu ainda tenho uma tarde inteira.

-Eu conheço essa fala... Gosta de Cássia Eller?- já engatilhou o tímido, porém nada bobo rapaz.

E começaram a conversar, simplesmente fizeram um intercâmbio de ideias e assuntos. Pela primeira vez estavam falando sobre algo que não fosse escola, notas, deuses gregos. E o menino acabou por descobrir que Verônica tocava piano, que ela também gostava de Guns n’ Roses, que ela lia livros todo o tempo para matar o tempo livre que tinha devido à solidão de suas tardes (e por isso era tão boa aluna), que ela com 16 anos já havia aprendido a dirigir. Contou ainda que era filha única, que sua família é de São Paulo e que ela não chegou a conhecer sua mãe. Foram até o piano na sala de visitas, um Fritz-Dobbert. Ela tocou um dos Noturnos de Chopin para ele, fazendo-o morrer de vontade de aprender o instrumento. Até tentou, mas os dedos dele eram duros demais, de alguém que está sempre escrevendo. Só que, para sua amargura , o tempo passa, e já eram 17h. Sabia que deveria voltar sem mais delongas. Deu um caloroso tchau, e foi-se, deixando a morena mergulhada na sua solidão novamente.

Loucura de sexta-feira. Todos insanos para ir embora da escola e Verônica até mudou de lugar para conversar com o seu admirador secreto, deixando todas as suas amigas e playboys de lado. Quando soou o sino, disse:

-Cícero, quer ir na minha casa hoje de novo? Podemos estudar juntos.

“Pai, leve o Cícero hoje mais uma vez, vamos terminar o trabalho”. “Oi mãe, eu não vou almoçar de novo, tenho que terminar o trabalho! Tchau!”

Comeram bife à milanesa, rindo e contando episódios engraçados de suas vidas. Se entupiram de refrigerante, e esticaram o corpo nos sofás. E começaram a conversar, e foram cada vez contando coisas mais íntimas. Dessa vez, Cícero foi quem se abriu: contou que era de uma humilde família, que seu pai trabalhava muito e que sua mãe cuidava de milhares de coisas. Contou, ainda, que sonhava em ser engenheiro, alguém importante. E por detrás de tudo isso, escondia-se um menino triste, mas com uma centelha de esperança de mudar, um menino com medo de abandonar os estudos por falta de competência e tornar-se um vadio, tal como seu irmão.

E foi uma tarde muito agradável. Lá pelas 18h, quando o sol começava a se pôr, ambos já sabiam que já era chegada a hora da partida. Verônica saiu de seu sofá e sentou-se ao lado dele. Olhou nos seus olhos, e disse:

-Muito obrigada por ficar aqui comigo. Nunca, nenhum dos meus amigos me deixaram tão feliz. Minhas tardes são sempre monótonas. Venha aqui sempre que quiser. Sua presença me agrada, Cícero.

A frequência cardíaca do garoto já ultrapassava os 100bpm, ele suava frio e ele estava sentindo um comichão estranho. E agora? Beijar ou fugir? Um até logo ou uma obra de cinema? “É melhor eu tentar, senão nunca vou saber. Não, é melhor não, ela vai ficar brava e vai virar a cara. Não, eu preciso...” Quando voltou à realidade, ele já estava tendo um lento e molhado beijo de língua. Após alguns bons trinta segundos, ela parou e sorriu para ele. Naquele átimo, Cícero já não lembrava mais nem seu próprio nome.

Deixou a casa sem falar muito. Foi a pé, lentamente, com uma felicidade que jamais havia experimentado.

E assim, oito meses se passaram. Na metade das férias de dezembro, sábado à tarde, um sol escaldante que, sobre as árvores, provocava uma sombra frondosa e confortável. Eles se ligaram e combinaram de se encontrar na praça que ficava entre o caminho de suas casas. Lá chegando, cumprimentaram-se com um “selinho” e deram as mãos. Andaram um pouco, conversaram sobre o que fizeram na ausência um do outro, e sentaram-se próximo a uma clareira, onde ninguém estava. Retomaram o colóquio com um assunto novo:

-Eu acho que estou gostando sério de você. Nunca deu nada errado, é tudo tão perfeito, Cícero... Parece que ninguém atrapalha, como se ninguém soubesse...

-Então estamos tendo um caso, somos amantes?

-É isso mesmo!- Riu.

Concordando sempre, Cícero passivamente já nem prestava mais atenção nas palavras dela. Apenas se concentrava no seu rosto e nos seus olhos verdes. De repente, ela propôs que eles fossem à casa dela, pois queria mostrar qualquer coisa. E foram. Ao chegar a casa de Verô (como agora era chamada), subiram ao seu quarto.

-Silêncio, pois meu pai não sabe que estamos aqui!

E subitamente eles começaram a se beijar. Mas beijar diferente, com uma intensidade maior, e com um desejo que Cícero já conhecia, mas que Verônica não estava acostumada. Eles começaram a trocar carícias e, no clímax, começaram a se acariciar onde queriam. E fizeram com amor, não foi algo carnal. Longe de algo destruidor e perverso, fizeram pelo afeto e não pelo desejo instintivo humano. E caíram na cama, contentes, sob juras de amor. Verônica ouviu pela primeira vez em sua vida de alguém que não fosse seu pai, um “Eu te amo.” Adormeceram.

Como era um final de semana de férias, ninguém ligava para horário, e já eram 20h quando despertaram. Verônica levantou-se, e disse:

-Venha ver algo.

Pegou um baú de madeira reforçado com vigas de ferro, trancado com um grande cadeado. Não permitiu que Cícero visse onde ela guardava a chave. Abriu, e lá dentro residiam muitas coisas. Uma caixinha de música, um par de brincos, uma caneta desgastada, um sapato de bebê, um álbum de fotografias entre outros mimos.

-É seu? De quando é esse álbum?

-Sim, é meu. São fotos dos meus pais, antes de eu nascer. Veja eles no Guarujá!

E Cícero observava com atenção todas aquelas fotos, vendo na mãe de Verônica uma semelhança incrível com a filha. Chegaram em uma fotografia que foi tirada bem próxima do casal.

-Minha mãe morreu voando de avião depois de eu nascer, numa viagem a negócios... Como eu gostaria de ter conhecido.

-Não é possível... Mas Verô, eu acho que já vi essa mulher.

-Deve ter sido uma mulher simplesmente parecida! Meu pai não mentiria para mim.

-Não... Lembro deste rosto e principalmente destes olhos, eu já vi em algum lugar.

-Você está me deixando nervosa, bebê. Sem brincadeiras sobre a minha mãe!

-Agora eu me recordo... Quando eu vinha para cá, eu dei um encontrão com ela!

Verônica estava nervosa, cheia de emoções misturadas. Não sabia se ria ou se chorava. Como pode o namorado que conheceu ao acaso trazer informações sobre sua mãe, que supostamente falecera?

Cícero propôs-se a ajudar Verônica a procurar a mulher. Só que era de conhecimento dos dois que seria uma procura em vão.

-Acho que o melhor, no momento, é esperarmos. Se você sair atrás dela, vai dar muito na cara e ela pode fugir. Deixe que eu cuido disso.

Os próximos dias foram de clima tenso entre os dois. Deixaram de se ver, nem se telefonaram mais, tudo sob a alegação de que ninguém fora eles mesmos poderia suspeitar do envolvimento amoroso em que estavam mergulhados. Não contaram para ninguém, e o pai da morena nem imaginava de tudo que estava ocorrendo. Para o casal, ele também era um suspeito.

No domingo, já pelas 22h35, Verônica percebeu uma movimentação na frente de sua casa. Duas pessoas de moto, o piloto e a pessoa da garupa que tinha aparência de mulher, rodearam o bairro por algumas vezes. Seu pai já dormia, e a menina decidiu pegar a chave do Opala em cima do aparador.

Ligou o carro, e saiu. Procurou por algum tempo nas redondezas até achá-los e, sem ser vista, seguiu a moto a uma distância razoável. Não tinham pressa e ela não ultrapassou os 50km/h. Acabou por chegar no outro lado da cidade, onde os motoqueiros entraram num pequeno beco, por onde o Opala não passaria. Estacionou o carro e, com muito medo, foi até o estreito caminho.

Na escuridão parcial, tateava as paredes por onde ia. Ouvia vozes e murmúrios, por tratar-se de uma vizinhança pobre. Foi abordada algumas vezes pelos moradores, que ignorava. Até chegar num canto, onde não havia saída. Desiludida, voltou ao carro e seguiu para sua casa.

-Eu perdi minha última chance...

Naquela mesma noite, aos prantos, Verônica ligou para Cícero explicando-lhe o ocorrido e dizendo que, depois de semanas observando os arredores de sua casa, perdeu a oportunidade de descobrir aquela incógnita.

Cícero ainda não havia engolido toda aquela história. Não se conformava com o fato de que a mãe de Verônica estava viva e na mesma cidade que ela. Por isso, esperou até chegar uma quarta-feira, que foi o mesmo dia da semana em que foi à casa de Verônica e esbarrou com aquela mulher misteriosa. Na mesma hora, no mesmo lugar, lá espreitou e esperou. Por uma grande sorte (ou por ações metódicas da mulher) Cícero viu novamente a mãe de sua amada passar. Discretamente e de longe, traçou o mesmo caminho que ela, que não seguia mais para um beco e sim, para um galpão abandonado. A já senhora abriu os portões, entrou e saiu do campo de visão do garoto. Este, que era muito leve, não encontrou grandes dificuldades para pular o muro e adentrar no local onde, agora, era um invasor. O galpão estava cheio de carros, todos de alto padrão. Fuscas, Pumas, Opalas, BMW e Mercedes Benz dentre outros importados estacionados por toda parte, faziam de tudo aquilo cada vez mais confuso. Limpo, tinha alguns poucos holofotes, cuja luz Cícero conseguiu evitar. Havia perdido a mulher de vista, mas atravessava o recinto, com a esperança de enxergá-la nos fundos.

Sua hipótese se confirmou: a suposta mãe de Verônica lá estava, dessa vez sem capacete de moto, conversando com um homem de meia idade. Era, de fato, a mãe da menina: a semelhança não permitiria disfarce algum. Entretanto, ao se aproximar, o menino esbarrou numa pilha de rodas de ferro, deixando-as cair e causando grande estrondo. Foi visto e só pôde ouvir:

-Fuja!

Os desconhecidos montaram na moto que lá estava, e bateram rapidamente em retirada, por uma pequena via que levava a uma área de mata no fundo do terreno. Atônito, foi imediatamente à casa de Verônica e disse:

-Pegue o carro, eu vi sua mãe e sei para onde ela está indo.

Pisando fundo, Verônica dirigiu rapidamente até aquele local que já esteve outrora. Entretanto, o alvorecer era iminente, e tudo estava visível desta vez. Estacionaram o veículo a uma distância segura e foram, desta vez sem medo, até o fim do beco, onde encontraram, na claridade do dia, um risco na parede. Era um bloco de concreto, passível de ser removido. Fazendo muita força, os dois empurraram o pesado aparato para dentro, e penetraram no pequeno espaço. Era o fundo de um casebre, dentro de um cortiço.

Andando pela casa, Verônica viu, ofegante, a mulher de costas. Cícero a reconheceu.

-Quem é você, afinal?

Subitamente, a mulher virou-se e estava portando um revólver. Mas, ao perceber de quem se tratava, de imediato suas mãos ficaram trêmulas, e o instrumento da morte caiu no chão.

-Meu Deus, minha filha... O que você está fazendo aqui?- e a mulher abraçou Verônica com força. Sem entender nada, Verônica que esboçava um pouco de choro, perguntou:

-Por quê fez isso comigo? Por quê não vivemos juntos, o que aconteceu?

A mulher identificou-se com um nome que não era o que conhecia. Bárbara, como se autoapresentou, disse que fez aquilo para proteger Verônica.

-Minha filha, eu faço parte de uma quadrilha que rouba carros. Eu sempre fui pobre, e comecei assim a ganhar dinheiro. Mas, quando eu conheci seu pai, as coisas mudaram. Após eu ficar grávida de você, eu soube que não poderia esconder mais a farsa, então fiz um testamento garantindo ao seu pai muito dinheiro, com o que ele comprou o escritório onde ele trabalha hoje. Então fingi que ia à Inglaterra para negócios, e forjei minha morte, para que você e o seu pai não se envolvessem mais comigo. Eu soube, desde o começo, que aquilo era uma paixão proibida e que isso só representaria perigo para vocês.

-Mas, agora, então estamos em perigo...

-Sim! Você e o bonito rapaz devem ir embora, pois a polícia está no meu encalço. Eu vim aqui para matar a saudade do tempo de casada e te ver de longe... Mas eu não esperava por isso. Agora, vão!

Os dois saíram às pressas. Podiam ouvir sirenes de polícia, pois um dos moradores achou a movimentação estranha e acabou por chamar a polícia. Conseguiram fugir sem serem vistos.

-Promete não contar para ninguém, Cícero?

-Prometo.

-Eu amo você.

Essa história não tem final, pois o amor verdadeiro nunca acaba. Viveram felizes sim, para sempre.