Flashes de Porto Seguro (2) – O meu terroir
 
 
Estava lendo na Revista Vida Simples o artigo de Eugênio Mussak. O terroir de cada um (Você pode conhecer diversos lugares do mundo, só que o mais importante é aquele que nos sentimos em casa) e me lembrei dele: Francisco, o menino bonito que vendia colares a R$ 1,00 nas proximidades do Memorial Indígena na praia da Coroa Vermelha (Santa Cruz Cabrália).

Ele queria que eu comprasse seu último colarzinho. Para me ajudar, dizia. Só que me encontrou em um dia em que, logo pela manhã, eu havia reafirmado promessa diária de consumista – nada comprar que não fosse realmente necessário. Eu sabia que nunca usaria aquele colar. Após vários nãos, ameus ombros, olhos nos olhos, o sorriso mais lindo e irresistível, eu disse: O colar eu não compro, mas se você quiser ir comigo, eu levo. Ele abaixou os braços, engoliu o sorriso e disse: Eu não posso, Dona. E face a minha interrogação ele respondeu: Porque eu sou daqui.

 
 
No final do encontro acabei comprando o colar, mas como não queria dar esmolas nem quebrar minha regra do dia, fiz o menino do sorriso inesquecível prometer que o daria para a primeira menina bonita que encontrasse, porque agora o colar era meu e era assim que eu queria que fosse feito.

 Infelizmente dias mais tarde acabei quebrando a promessa: em uma manhã em que todos foram se divertir na praia, saí para dar uma volta pelos arredores do hotel. Já estava voltando quando dei de encontro com uma mulher, também índia, que sem mais nem menos me disse: Falaram que estavam distribuindo alimentos ali no Hotel onde fui batizada e eu vim buscar, mas nada encontrei, já tinham levado tudo. Parei para conversar com ela, curiosa que sou e descobri que estava vindo do Hotel onde nos hospedávamos. De fato, no dia anterior, durante uma celebração, cada um de nós contribuiu com um quilo de alimento não perecível que seriam distribuídos para entidades beneficentes, entre elas uma Reserva Indígena.Feia, mal tratada, ela contou-me que tinha sido batizada naquele piscinão lá do Hotel, por um Culto Evangélico. Contou-me ainda que acabara de ficar viúva com cinco filhos pequenos para criar: o marido tinha sido assassinado. Por quê? Perguntei e ouvi a resposta curta, mas bem explicativa: drogas.

Percebendo que algumas pessoas conhecidas se dirigiam ao hotel, como eu, dei cinco reais para a mulher e me despedi sem mais delongas. Já tinha muito para pensar. Índios, Igrejas Evangélicas, droga, miséria, mas principalmente sobre o meu terroir, para onde eu voltaria no dia seguinte, confirmando uma máxima: Viajar é muito bom, mas o melhor é voltar para casa.