.:. O poder da bichona .:.
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Acordei cedo – mais que o normal, para um final de semana. O domingo estava lindo.
Apressado, vesti, após rápido banho, a mesma cueca pelo avesso e com a frente voltada para trás – Consegue entender como ficou? Minha esposa vive a encher-me com isso. Sou chamado de nojento e de imundo só por causa da mania de repetir as roupas de baixo. Poxa! Não há imundície nesse processo de inversão! Praticidade, economia: isso sim! Mas, que ficou estranho ficou... Sobrava pano na frente e surgiu considerável desconforto pelos fundos da paisagem humana.
Pus uma camisetinha da Tomi Hilfiger (comprada em São Paulo, por módicos vinte reais), calça listrada com mais de oito anos de uso e uma meia, também listrada, que já me valeu – até – similaridade com o Agostinho do programa televisivo “A Grande Família” durante viagem que fiz a Curitiba. Desconhecia a figura emblemática do Agostinho, antes da comparação, mas a elegância no vestir realmente fazia sentido, pois somos dois homens de bom gosto! E, assim, travestido de zebrinha multicolorida e cheio de arroubos de soberba, desci a escada do sobrado onde moro.
Formalidades do lar cumpridas. Elogios e reclamações britanicamente dados, estávamos prontos para sair.
Na garagem, a novidade: a Hilux deixada pelo meu cunhado. Ele costumava ir a Sampa de Caetano e nossa casa funcionava como entreposto. Dessa vez, para nossa sorte, deixou a bichona na garagem! Quando se olha uma Hilux de perto ou de longe, sentimos uma vontade inconsciente, quase irresistível, de verbalizar: “Que bichona!”.
Aproveitando a cortesia do cunhado, decidimos realizar um passeio de final de semana a dois. Estranhamente, sempre que saímos é ela – a esposa – que me espera, pronta, para irmos a qualquer lugar. Isso me vale outros reclames, mas já acostumei. Ligamos o carro. Acionei o controle do portão. O portão se abriu, lentamente. Saímos.
No caminho, a paisagem parecia diferente. Parecíamos distintos também. As pessoas nos olhavam de forma estranha, mais detalhadamente. Um dos nossos vizinhos, empresário trintão e solteiro, depois do espanto de nos perceber passeando na bichona, fitou-nos com o olhar traiçoeiro, de quem tem medo de encarar. Sabíamos que nos bisbilhotava, mas era um olhar oblíquo, de perplexidade. O constrangimento foi tão imenso que decidimos retornar.
Ao anoitecer, eu, minha esposa e nossas duas filhas fomos jantar num dos restaurantes da cidade, o que já fazíamos há cinco anos, quase ritualmente, nos almoços de domingo. Era um lugar aconchegante e os garçons já nos conheciam e eram conhecidos pelo nome.
Chegamos. Estacionamos o carro. Sentamos. As meninas iniciaram rápida discussão para saber onde cada uma sentaria... Para nossa surpresa, dois garçons vieram nos atender. Aliás, um garçom e o maître. Sem cerimônias, mesmo sabendo de cor o que sempre pedíamos, um dos garçons perguntou:
– O senhor vai pedir picanha nacional ou importada?
Eu e minha esposa nos entreolhamos apavorados. O garçom, estático, esperava resposta:
– O de sempre, por favor! – Respondi.
Ele entrou e, minutos depois, trouxe a nossa refeição: maminha, baião de dois, batata frita, macaxeira, linguiça, salada verde, suco de laranja, farofa; de entrada, dois pães de alho.
Comemos. Pedimos a conta e, na saída, nova surpresa: os garçons, ao desfazerem a mesa, ficaram a nos admirar saindo na bichona.
Mais tarde, já na cama e prontos para dormir, comentamos sobre os fatos e as reações humanas ocorridas ao longo do dia e sorrimos muito, pois, embora endividados, fomos alvo de olhares curiosos, sequiosos e invejosos... Ah! Se soubessem que dentro daquele carrão, da bichona prata, havia mais de setenta mil em dívidas!
A bichona continua aqui em nossa casa, na garagem, pelo menos até meu cunhado retornar. E, se você for de confiança, eu posso emprestá-la por um dia, não mais que isso!
Crato-CE, 25 de abril de 2010.
19h45min
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Relativizemos o sentido da palavra importante... Para mim, importantes seriam: Deus, minha família e meus amigos; mas se o importante é ter poder e dinheiro, mudam os referenciais.
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