Meu voto por um poço
O povoado é perdido numa área bem remota.
Em virtude de programas de universalização eles são supridos nessa área.
É uma vila, com grupo escolar, um arremedo de posto de saúde e as casas agrupadas em círculos. Tudo certo, são quase auto-suficiente em alimentação, pois plantam mandioca, milho e criam galinhas.
Há uma associação de moradores, que funciona como juizado de pequenas causas, que resolve desde disputa entre vizinhos e pleitos diante da sede, até o transporte de algum doente pra o municipio mais próximo, distante duas léguas.
Estaria tudo bem, não fosse o maior percalço que eles sofrem. A região é semi-árida e o poço da região está secando. Poços freáticos não dão água e o açude cavado por eles está quase no fim.
A sede do municipio envia um engenheiro pra avaliar o caso, fazer sondagens e resolver o caso da água.
O engenheiro anda investigando, entrevista os moradores, e após dois dias tem seu laudo pronto.
O presidente da associação acompanha tudo e nesse ínterim já reuniu o povo duas vezes no grupo escolar.
O engenheiro já ganhou cafezinho com biscoito caseiro, uma cadeira de tecido pra ele sentar enquanto olhava as plantas. Tem recebido tratamento gentil e credita tudo a hospitalidade natural da gente dali.
Então ele é instado pelo presidente a dar resposta do que será feito. Desenvolve-se o seguinte diálogo.
Então, doutor, quando nós vamos ter água?
Sr. Felisberto, a prefeitura vai andar uns técnicos...
Doutor, eles não resolveram nada antes, a gente conta com o senhor.
Amigo, meu trabalho é de avaliação e vou entregar o relatório, pra eles darem a solução.
Doutor e a solução qual é?
Há possibilidade de um poço naquele baixa no fim da vila e é isso que vou dizer.
Doutor, nós contamos com o senhor, o senhor não pode furar esse poço?
Sr. Felisberto, eu não tenho máquina, não sou empreiteiro e a prefeitura é quem vai cuidar disso.
Doutor, o senhor é candidato?
Eu?!! não...
Doutor, quem é seu candidato?
Eu...
Pode dizer doutor, a gente está do seu lado.
Não tenho candidato ainda. - ele não entende o rumo da conversa.
Doutor, o senhor querendo, aqui tem oitenta votos pra o senhor.
O queixo dele cai e ele abre a boca sem conseguir falar.
É, doutor, nesta vila tem oitenta votos. Já conversamos e acertamos tudo, o senhor ganha oitenta votos pra quem quiser, se o senhor resolver logo isso pra gente.
Isto é uma amostra do que ainda acontece nos mais remotos rincõe da nossa terra.