SAUDADE, POR QUE NÃO?
Por Carlos Sena
Por Carlos Sena
Seria bom que a SAUDADE fosse instalada em nós de acordo com nossas vontades. E que elas por si só disputassem com o nosso passado os melhores momentos para em nós se eternizar. Porque o tempo passa, a gente fica menos jovem e muita coisa boa vai aos poucos ficando no “limbo” das nossas recordações. Muitas vezes a gente precisa parar, encontrar amigos de infância e “recordar” – como que reviver algumas passagens lindas que em nós se perderam no emaranhado de outras emoções vida afora. Um dia, no rol dessas recordações, eu me lembro da primeira piada. Se eu fosse repeti-la hoje ninguém acharia graça. Mas eu me lembro e, ilustrativamente, a repito: um coleguinha de grupo escolar chegou pra mim e disse “você sabe por que a mata é virgem”? – Não. – Porque o vento é fresco, respondeu. Outra piadinha insossa, mas na época importante: “por que O PADRE SENTE FIRO”? – Porque está NU COM VENTO (no convento)! Como se percebe, uma simples piada poderá ser inesquecível em nossa vida dependendo do seu contexto, principalmente quando nos remete à infância. Mas há outras SAUDADES que se nutrem de lembranças. Como se vê, Saudade e Lembrança são duas irmãs gêmeas. A lembrança, certamente é quem nute nossas saudades e por isto, muitas vezes, o cotidiano moderno da cidade grande nos afasta um pouco delas e tira a SAUDADE de cena, em alguns momentos que elas não precisavam se ausentar. No rol dessas saudades aquelas que quase nunca ninguém se esquece: a primeira paixão pela professora, o primeiro beijo, o primeiro encontro, a primeira comunhão. A primeira masturbação a gente nunca esquece – eis também uma SAUDADE que se evidencia quando se chega aos outonos existenciais – algo como “o primeiro sutiã a gente nunca esquece”. No rol dessas saudades, uma que nos marcou imensamente: a primeira calça comprida! Ah como nos sentimos “jegues” dentro daquele monte de pano se comparado com as nossas calças curtas... Hoje eu me recordo com SAUDADES dos “castelos de areia” que construímos... Igual às calças curtas, como eles foram curtinhos! A realidade da vida supera tudo, toma conta de tudo e a gente se joga pro mundo feito fera, como dizia Augusto dos Anjos: “entre feras, sentimos a necessidade imperiosa de também ser feras” (grifo meu)...
Aos poucos, a gente vai se dobrando às saudades que se mantêm em nós por conta própria e querendo que algumas outras não se afastem de nós pela impropriedade da conta. A conta corrente da vida cobra juros de mora: mora pra ficar conosco; mora pra não se esconder de nós; mora feito a brasa de Roberto – você é uma brasa, mora? Então, de SAUDADE em saudade a gente tenta recuperar o tempo perdido – ou não? Corrijo-me: o tempo não se perde porque ele não se acha. O tempo é a universidade do sentir que por ser volátil não se dobra aos nossos rigores racionais. Assim, meio com SAUDADES, requeiro a Deus que pela impossibilidade de determinar que nossas SAUDADES não se escondam de nós, firmo-me saudosamente me lembrando do cheiro do café fresco, cedinho da manhã, ao pé do fogão da casa da minha mãe quando criança um dia fui...