Show de Marionetes
As pessoas que colocam diante da gente na TV, com seus rostos carregados de maquiagem, transfiguram-se em verdadeiros bonecos. Que não têm tempo algum, além do cronometrado, para pensar sobre o que estão lendo. Quando se trata, por exemplo, dos apresentadores de tele-jornais. Basta a reprodução mecânica do que está escrito. Penso se haveria grande diferença se pudéssemos trocar a voz deles por uma gravação. Suas bocas estariam mexendo, mas não diriam o que estivéssemos ouvindo. A televisão atuaria como um ventríloquo. Que é o que acontece com os filmes dublados. Embora nesses filmes estejamos diante de uma versão das falas originais.
Os apresentadores dos programas de auditório (em sua maioria, ao que parece, gravados) podem também ser confundidos com bonecos. Por se acharem submetidos sempre ao mesmo tipo de script. Se fizermos um inventário das entrevistas realizadas nesses programas, vamos verificar que as perguntas, se não são sempre as mesmas, admitem um flagrante paralelismo. E as respostas, obviamente, tendem a ser parecidas, já que nunca se pode dizer exatamente o que se pensa. Sobretudo diante das câmeras. Os diretores/produtores do programa, os patrocinadores e os donos das emissoras não podem ser contrariados. E nem mesmo o público, que está diante da telinha para saber, na verdade, o que você acha que pensa, não a autenticidade do seu pensamento. Nesse sentido, o público se comporta também como um boneco, na medida em que está sempre preparado para ouvir as mesmas perguntas e respostas, o que não lhe dá margem a maiores questionamentos. Só que com uma pequena diferença: a pessoa diante da telinha além de não usar a pesada indumentária facial e de poder contrariar quem eventualmente estiver perto dela, num surto anti-bonecóide, por não existir o medo de perder o emprego ou ser preso, tem o supremo poder de desligar a TV. Que não tem o direito de se desligar do público, já que fica 24 horas no ar. Por razões econômico-financeiras, é claro.
É possível que se tornem irremediavelmente irritantes as vozes dos bonecos se tivermos que ouvi-las o tempo todo. Durante anos. É o que acontece, em muitos casos, com os apresentadores dos chamados programas de auditório. Talvez nem seja pela repetição daquele mesmo timbre, mas do que dizem, perguntam, anunciam ou insistem para que a gente compre.
Imagino como deve ser difícil para alguém travestir-se de boneco para poder trabalhar. Mesmo com a compensação de não se tornar mais um na multidão, pelo constante aparecimento na telinha, e poder dispor de um salário que você e eu, ilustres desconhecidos, não temos chance de receber no fim do mês.
Teresópolis, 23/06/2012