3 Minutos Para o Meio Dia
De manhã o céu já chorava lágrimas finas.
Neblina cinza, tudo molhado.
Chovia tanto que meus pés já congelaram antes de sair da coberta.
Lutei contra o hábito da oração matutina. Estou de mal com o Pai.
Filha mimada quando emburra, sai de baixo. Mas Ele me castigou arduamente. Ainda estou chateada.
Fazer o que? A tristeza ainda é grande. O buraco não fecha.
Meus pés que há dez segundos estavam aconchegantes na coberta se congelam completamente agora que veste os chinelos frios.
Caminho até a cozinha e olho pra fora. Chuva. As roupas de sábado ainda estão no varal. Aff! Minha blusinha branca que eu queria usar hoje ainda deve estar molhada. Porque eu não a coloquei atrás da geladeira?
Me visto. Dou uma olhadela pro céu. Sei que Ele está lá me observando, mas finjo que não me importo.
Me atraso um bocado por culpa desse cabelo idiota. Por que eles teimam em ficar eriçados quando chove? Bendita chapinha!
Quando penso que tudo vai correr bem, lá vou eu correr atrás do ônibus, por sorte estou em forma, consigo correr até o outro ponto cortando as ruas. Subo aquelas escadas quase sem ar. De repente até a garganta queima. O guarda chuva quase fica pra trás.
Finalmente chego. Respirei fundo e quase faço o sinal da cruz, mas venci outro hábito. “Não. Estou brava com Ele” _ penso.
Ah! Finalmente uma biblioteca repleta de livros desordenados para ocupar minha cabeça.
Quando pensei que poderia me sentir aliviada, já a primeira pessoa que me encontra ao invés de simplesmente sorrir e dizer bom dia resolve ter a ideia brilhante de me perguntar se estou bem. “Se estou bem? O que ela tá querendo? Caçoar?”
Parece que por combinado todos resolvem ir dar uma passadinha no meu setor, acham que me ajudam se derem um tapinha no ombro. Em certo momento sei que assustei, devo ter feito cara de cachorra defendendo a cria porque vi as fisionomias consternadas se afastarem.
Ufa! Agora sim. Posso trabalhar em paz.
As horas passam e o nó na garganta começa a ferir de novo, a coçar, irritar. Vejo que algo quer verter dos olhos, mas não deixo. Luto. “Espere até o seu almoço, assim poderá se trancar aqui e chorar o quanto quiser.” _ pensei.
Mas as horas passavam e a fenda do peito parecia querer se abrir. Ninguém entende!
Era quase meio dia, e então eu poderia me libertar.
Faltando três minutos para a hora tão desejada, vou caminhando lentamente até a porta, imaginando já poder trancá-la e chorar, chorar e chorar.
Ao tocar a maçaneta me deparo com uma aluna, ela sorri: “Oi tia, ontem fiz um desenho pra você!”.
Estendendo o bracinho frágil se esticou num abraço apertado, me deu um beijo e saiu, deixando o pequeno papel dobrado em minhas mãos.
Ela havia me desenhado debaixo de um grande sol amarelo, em frente a um castelo, onde chovia muito em todo o lugar. Menos em mim.
De repente, fechei a porta, toquei a garganta e senti que a dor passou. Chorei sim, mas por um motivo que valia a pena.