Eu nasci há dez mil anos

Na minha fase de infância, lá pelos dez, doze anos de idade, gostava muito de ler gibis, aquelas revistas que enchiam o nosso mundo de sonhos nos trazendo maravilhosas histórias, (para os Iniciados – as HQ) com fantásticos heróis, cada um mais poderoso que o outro. Ainda guardo a ansiedade com que lia as histórias do Super-Homem, sempre escondido na identidade secreta do Clarck Kent – tão secreta que apenas nós, os seus leitores a conhecíamos.

A propósito: estou relembrando os meus heróis, personagens míticos que me seguem por toda a parte, para dizer que fico estarrecido toda a vez que leio, ou ouço, alguém se intitular de Mestre, Curador, Ente Divino e outras sandices. A carência dessas pessoas, a necessidade de terem o próprio ego massageado é imensa, flagrante, daí buscarem notoriedade de todas as formas possíveis e imagináveis. Devo reconhecer que são escolhas comportamentais, e é um direito inalienável de cada um escolher como quer se comportar na vida. Até aí nada demais.

Mas, como sempre tem um “mas” para azucrinar as ideias da gente, a roda começa a pegar, a porca torce o rabo, quando sujeitos com esse comportamento passam do exibicionismo puro e simples para a prática de iludir da boa-fé dos demais, a impingir conceitos que eles mesmos sabem ser completamente fora da realidade. Acrescento que, para colocar mais cal na cova, o tempo em que vivemos é sedento de novidades, do non sense, do despropositado, o que favorece a incidência desses fatos.

Ontem, ao passar por uma livraria para dar uma espiadela nos livros lá expostos, me deparei com alguns autores que quase me fizeram ter um enfarte: um deles, com um nome convenientemente indiano, (ou algo bem próximo disso) um misto de babalorixá e um dignitário brâmane, se intitulava como um semideus encarnado entre nós; já um outro, não menos modesto que o seu antecessor, se propunha a levantar defunto de suas tumbas, algo menos prosaico do que os tradicionais aleijados que saem correndo guapos de suas cadeiras de rodas nas muitas igrejas que superlotam nossas cidades.

Bem. Claro que saí daquela livraria mais rápido do que o cavalo do Zorro, o Silver, quando atravessava um precipício enorme, com o meu herói em cima. Tenho para mim que, provavelmente de nada irá adiantar essa minha reclamação: damas, engalanadas em seda, garantirão que foram Cleópatra em encarnações anteriores; (prostituta ou ladra, claro que ninguém foi...) cavalheiros, com suas cabeças protegidas por reluzentes turbantes, bradarão aos céus que são o novo Avatar (seja de Cristo, Buda, Krishina ou Maomé: qualquer um serve) na Terra.

Gente, estou descobrindo que o melhor que tenho a fazer é retornar aos meus gibis e me divertir com as tentativas do Bizarro (o Dr. Jekill do Super-Homem) tentar vencer o original; ou então, esperar o dia em que o Coringa vencer o Batman. Aí sim: quando esse dia chegar o planeta Terra mudará e o povo não mais acreditará nesses milagreiros de Araque.

Terras de São Paulo, manhã de Terça-Feira, Lua Minguante de Maio de 2012

João Bosco

Aprendiz de Poeta
Enviado por Aprendiz de Poeta em 15/05/2012
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