Olhar sobre a minha alma
Tenho que buscar da memória quando tudo começou, e talvez, eu nem consiga exatamente; ainda assim, tentarei. Para falar da leitura, tenho que vincular à escola. Pois foi lá que aprendi as primeiras letras. Da educação infantil, recordo-me apenas das brincadeiras, diferente de hoje, naquela época, a educação infantil chamada então jardim de infância, não oferecia um trabalho com as letras. No entanto, pelo que me lembro, foi nessa época que ouvi as primeiras histórias contadas de um livro. Antes, ouvia as histórias dos meus avós oralmente.
Lembro que na alfabetização aprendia as letras através de histórias (método da abelhinha) e músicas e gostava muito de tudo isso. Meu irmão lia para mim alguns textos do seu livro da escola; tanto eu quanto ele curtíamos demais esse momento. Assim fui descobrindo o mundo da leitura. Foi na minha pré-adolescência que realmente comecei a ler livros inteiros. Aos doze anos, lembro-me de uma professora que me apresentou O Pequeno Príncipe. Lembro-me de suas palavras sobre o livro, sua adoração por ele. E nos foi indicado como leitura extraclasse. De fato gostei muito do livro, mas carregava a sensação de que eu não havia compreendido por completo. Recordo-me que ela havia dito que quando o lêssemos em outro momento de nossas vidas, teríamos outro entendimento. Eu carregava comigo essa sensação.
Aos catorze anos, outro livro extraclasse chamou a minha atenção, Música ao Longe de Érico Veríssimo. Não entendia meus colegas de classe reclamarem do livro! Diziam que era chato e cansativo. Não tinha essa visão; ao contrário, deliciava-me com a leitura e com o mundo para o qual me transportava nesses momentos.
Outra situação que eu lembro bem foi quando comecei a ter direito à mesada de meu pai. Não era muito, por isso eu aguardava ansiosamente o fim do mês para me dirigir à livraria, com minha irmã mais velha para comprarmos o livro do mês. Enquanto eu lia o meu, ela lia o dela e depois trocávamos. O melhor era comentarmos os livros no final de tudo. Deliciávamo-nos com os comentários, com a troca que fazíamos. Contávamos uma a outra a parte preferida da história, relacionávamos com nossa vida, ou pelo menos com a vida que desejávamos ter. Momentos que eu não posso esquecer!
Não me lembro de ter-me separado dos livros desde então. Cursei Letras, primeiramente por amor aos livros. Depois comecei a apreciar outras coisas também. Foi através da leitura na minha adolescência que escolhi o nome da minha primeira filha. Por sorte, consegui resgatar o livro num sebo para presenteá-la. Houve, por certo, grande identificação minha com a personagem protagonista desse livro e aquela história não sairá nunca da minha vida. Lembro-me que foi uma leitura catártica para mim, pois vivia um momento de intensa crise de adolescência, assim como a personagem.
Hoje, leio por muitos outros motivos, diferentes dos motivos que tive na adolescência, mas em nenhum momento da minha vida, a leitura deixou de ser uma viagem e uma catarse.