OS MALUCOS E OS CARETAS
Estava próximo do litoral, voltando para Curitiba, e já me programei para almoçar no Mamed, amigo que tem um restaurante num balneariozinho, na divisa da estrada.
Chegando lá sentei numa mesa, na sombra com a brisa batendo, e o sol claudicante ali do lado e enquanto aguardava o garçom vir limpar a mesa dei uma cheirada num copo com um restante de aguardente que tinha ficado ali.
E eu que não bebo nada há mais de quinze anos vi surgir algumas reminiscências, veio uma lembrança do passado, sem saudade nem melancolia, mas me encheu a memória de vivências tidas.
Sem saudade nem melancolia, pois a minha vida presente sempre foi melhor do que a logo passada, isto em qualquer estágio anterior e alguns posteriores ruins, mas que serviram de aprendizado,,,
...com exceção daquele período entre os treze e os dezessete anos que foram muito bons
Este período adolescente foi importante, pois no restante da vida vivi em busca, ou em função, dos sentimentos vivenciados naquele período.
Fui um felizardo de tê-los tido, para poder fazer o parâmetro que norteou a minha vida.
Muito tempo depois deste período era assim que acontecia, nas mesas de bares, naquela vida de peregrino que continuei levando.
Chegávamos e já nos ajeitávamos e ao lado dos copos e garrafas passávamos as tardes em mesas como a que sentei ali, vendo o movimento acontecer em volta enquanto os papos rolavam na melhor qualidade.
Mas tudo para mim era uma busca, tudo era uma passagem para chegar a um lugar que eu ainda não sabia onde era.
O papo rolava bem, as minhas turmas sempre tinham muitas coisas para contar e o ambiente era sempre descontraído, todos sempre com muitas vivências, ninguém tinha chegado até ali em branco, ou com uma página de vida pouco escrita.
Naqueles momentos ninguém tinha pressa, era como se as coisas fossem se ajeitando no passar das horas, sem que nos preocupássemos com isso.
Mesinha na sombra, longe da areia e do sol da praia. Nós só não tínhamos a manha de fazer músicas enquanto as mocinhas iam passando e, por outro lado, particularmente, nunca fui muito de cantorias, sempre dava preferência a um bom papo e assim ia o dia em conversas correntes.
Na maior parte das turmas que fui tendo ao longo da vida, até passar a andar só, nunca houve caretas, aliás, caretas, eu diria, nunca deviam beber nada, pois além de não combinar com eles, acabam sempre arranjando encrencas.
Aquelas turmas sempre foram de primeira desde os tempos em que viajávamos de carona, lá pelos anos setenta e quando ainda adolescente e o dinheiro, ou a falta dele, nunca foi empecilho que desestimulasse qualquer viagem ou “viagem”.
Íamos e as coisas iam se arrumando pelo caminho e os destinos sempre improváveis, mas os “malucos” eram como uma confraria, feito maçom, pois onde fossemos sempre nos enturmávamos, principalmente nas praias.
Nós nos reconhecíamos no meio da multidão e sempre havia lugar para mais um para usufruirmos aquilo que tínhamos.
Muitos se perderam, pois perderam a hora de sair, assim como acontece também com a bebida.
Aquele período moldou a cabeça que me norteia até hoje e no passado, pois nunca fui encucado com dinheiro e, talvez, por isto mesmo, ele nunca tenha sido problema, mesmo quando não o tinha.
E se o tinha e o programa fosse bom ele não amanhecia no meu bolso, embora o resto do mês tivesse que passar a míngua.
Sei que tenho a cabeça de maluco até hoje, embora nunca tenha gostado de drogas, embora naquela época só existisse, principalmente, o fumo que passarinho não fuma e alguma coisa que fazia a aula ficar mais colorida e que eram mais interessantes.
Sei que participamos da história aqui em Curitiba, onde eu conhecia todos os “Meu nome não é Jhonny”; era amigo de todos os mais doidos que existiam na cidade.
Não gostava de drogas, tinha um sentimento de auto-proteção forte que não me permitia as mais agressivas, mas era muito respeitado no meio deles e o ‘bicho de sete cabeça” era um dos que freqüentava o nosso espaço lá no colégio estadual.
Naquela época a droga tinha outra conotação, fazia parte de um contexto social que influênciou o mundo, o que não tem nada a ver com a catástrofe que acontece hoje.
Existia a contracultura, o movimento beat, os festivais de rock, a explosão do próprio rock, a luta contra a guerra do Vietnã nos Estados Unidos, a tropicália aqui no Brasil, o nosso Tim Maia aparecendo, o maluco beleza explodindo, os filmes de James Deam, o “nosso" Easy Rider, a opera rock Tommy do The Who, os filmes de Ingmar Bergman, sunshine, e por ai vai.
Todos nós tinhamos as nossas dificuldades, que ficavam escondidas nas imagens que passávamos, mas que havia o anseio de uma vida diferente do que se apresentava naqueles anos duros, isto era certo.
Para nós anos dourados.
Longe de mim imaginar que aquele camarada, o escritor do “Bicho de sete cabeça”, passava ou iria passar a barra que passou, depois que o pai, para livrá-lo do barato, o internou num manicômio.
Eu via, aqueles caras, apalermado, pela ousadia deles, era a turma realmente que eu admirava, pelas vivências a mil, pelas posições sociais, pelos namoros menos hipócritas.
Eu era um bom espectador.
A política não interessava, ainda éramos muito jovens, mas havia muita ousadia no convívio social.
Íamos aos casamentos tradicionais com as nossas roupas costumeiras e com cabelos que aniversariavam sem serem cortados. Não existia essa de ocasião especial, todas eram especiais.
O tempo foi passando, neste período passa rápido, e logo estávamos tendo que dar de cara com o tempo adulto, onde os sonhos coloridos deixam de existir, as amizades nos muros da esquina já não são tão bem vistas, a barra vai pesando.
Muitos foram saindo daquele meio, mas muitos se perderam, não souberam a hora de cair fora e se deram mal.
Há um tempo para tudo na vida e os períodos possuem tempo de validade, senão não evoluímos, mas depois veio os anos de busca e apaziguamento da alma que para mim duraram algumas dezenas de anos.
Mas vejo até hoje que ainda há os caretas, com quem só me dei mal quando me envolvi, e os malucos que nem sabem que na minha cabeça eles se encaixam desta forma.
Ser maluco não é estar ligado a nada, é só um estado de espírito mais leve, desapegado, e que vê a vida de uma forma mais prazerosa, humorada e que dá mais valôr às amizades e que se iniciou naquele período com um 'quê' especial.
"Não é o lugar em que nos encontramos nem as exterioridades que tornam as pessoas felizes; a felicidade provém do íntimo, daquilo que o ser humano sente dentro de si mesmo' Roselis von Sass - www.graal.org.br
www.hserpa.prosaeverso.net
Estava próximo do litoral, voltando para Curitiba, e já me programei para almoçar no Mamed, amigo que tem um restaurante num balneariozinho, na divisa da estrada.
Chegando lá sentei numa mesa, na sombra com a brisa batendo, e o sol claudicante ali do lado e enquanto aguardava o garçom vir limpar a mesa dei uma cheirada num copo com um restante de aguardente que tinha ficado ali.
E eu que não bebo nada há mais de quinze anos vi surgir algumas reminiscências, veio uma lembrança do passado, sem saudade nem melancolia, mas me encheu a memória de vivências tidas.
Sem saudade nem melancolia, pois a minha vida presente sempre foi melhor do que a logo passada, isto em qualquer estágio anterior e alguns posteriores ruins, mas que serviram de aprendizado,,,
...com exceção daquele período entre os treze e os dezessete anos que foram muito bons
Este período adolescente foi importante, pois no restante da vida vivi em busca, ou em função, dos sentimentos vivenciados naquele período.
Fui um felizardo de tê-los tido, para poder fazer o parâmetro que norteou a minha vida.
Muito tempo depois deste período era assim que acontecia, nas mesas de bares, naquela vida de peregrino que continuei levando.
Chegávamos e já nos ajeitávamos e ao lado dos copos e garrafas passávamos as tardes em mesas como a que sentei ali, vendo o movimento acontecer em volta enquanto os papos rolavam na melhor qualidade.
Mas tudo para mim era uma busca, tudo era uma passagem para chegar a um lugar que eu ainda não sabia onde era.
O papo rolava bem, as minhas turmas sempre tinham muitas coisas para contar e o ambiente era sempre descontraído, todos sempre com muitas vivências, ninguém tinha chegado até ali em branco, ou com uma página de vida pouco escrita.
Naqueles momentos ninguém tinha pressa, era como se as coisas fossem se ajeitando no passar das horas, sem que nos preocupássemos com isso.
Mesinha na sombra, longe da areia e do sol da praia. Nós só não tínhamos a manha de fazer músicas enquanto as mocinhas iam passando e, por outro lado, particularmente, nunca fui muito de cantorias, sempre dava preferência a um bom papo e assim ia o dia em conversas correntes.
Na maior parte das turmas que fui tendo ao longo da vida, até passar a andar só, nunca houve caretas, aliás, caretas, eu diria, nunca deviam beber nada, pois além de não combinar com eles, acabam sempre arranjando encrencas.
Aquelas turmas sempre foram de primeira desde os tempos em que viajávamos de carona, lá pelos anos setenta e quando ainda adolescente e o dinheiro, ou a falta dele, nunca foi empecilho que desestimulasse qualquer viagem ou “viagem”.
Íamos e as coisas iam se arrumando pelo caminho e os destinos sempre improváveis, mas os “malucos” eram como uma confraria, feito maçom, pois onde fossemos sempre nos enturmávamos, principalmente nas praias.
Nós nos reconhecíamos no meio da multidão e sempre havia lugar para mais um para usufruirmos aquilo que tínhamos.
Muitos se perderam, pois perderam a hora de sair, assim como acontece também com a bebida.
Aquele período moldou a cabeça que me norteia até hoje e no passado, pois nunca fui encucado com dinheiro e, talvez, por isto mesmo, ele nunca tenha sido problema, mesmo quando não o tinha.
E se o tinha e o programa fosse bom ele não amanhecia no meu bolso, embora o resto do mês tivesse que passar a míngua.
Sei que tenho a cabeça de maluco até hoje, embora nunca tenha gostado de drogas, embora naquela época só existisse, principalmente, o fumo que passarinho não fuma e alguma coisa que fazia a aula ficar mais colorida e que eram mais interessantes.
Sei que participamos da história aqui em Curitiba, onde eu conhecia todos os “Meu nome não é Jhonny”; era amigo de todos os mais doidos que existiam na cidade.
Não gostava de drogas, tinha um sentimento de auto-proteção forte que não me permitia as mais agressivas, mas era muito respeitado no meio deles e o ‘bicho de sete cabeça” era um dos que freqüentava o nosso espaço lá no colégio estadual.
Naquela época a droga tinha outra conotação, fazia parte de um contexto social que influênciou o mundo, o que não tem nada a ver com a catástrofe que acontece hoje.
Existia a contracultura, o movimento beat, os festivais de rock, a explosão do próprio rock, a luta contra a guerra do Vietnã nos Estados Unidos, a tropicália aqui no Brasil, o nosso Tim Maia aparecendo, o maluco beleza explodindo, os filmes de James Deam, o “nosso" Easy Rider, a opera rock Tommy do The Who, os filmes de Ingmar Bergman, sunshine, e por ai vai.
Todos nós tinhamos as nossas dificuldades, que ficavam escondidas nas imagens que passávamos, mas que havia o anseio de uma vida diferente do que se apresentava naqueles anos duros, isto era certo.
Para nós anos dourados.
Longe de mim imaginar que aquele camarada, o escritor do “Bicho de sete cabeça”, passava ou iria passar a barra que passou, depois que o pai, para livrá-lo do barato, o internou num manicômio.
Eu via, aqueles caras, apalermado, pela ousadia deles, era a turma realmente que eu admirava, pelas vivências a mil, pelas posições sociais, pelos namoros menos hipócritas.
Eu era um bom espectador.
A política não interessava, ainda éramos muito jovens, mas havia muita ousadia no convívio social.
Íamos aos casamentos tradicionais com as nossas roupas costumeiras e com cabelos que aniversariavam sem serem cortados. Não existia essa de ocasião especial, todas eram especiais.
O tempo foi passando, neste período passa rápido, e logo estávamos tendo que dar de cara com o tempo adulto, onde os sonhos coloridos deixam de existir, as amizades nos muros da esquina já não são tão bem vistas, a barra vai pesando.
Muitos foram saindo daquele meio, mas muitos se perderam, não souberam a hora de cair fora e se deram mal.
Há um tempo para tudo na vida e os períodos possuem tempo de validade, senão não evoluímos, mas depois veio os anos de busca e apaziguamento da alma que para mim duraram algumas dezenas de anos.
Mas vejo até hoje que ainda há os caretas, com quem só me dei mal quando me envolvi, e os malucos que nem sabem que na minha cabeça eles se encaixam desta forma.
Ser maluco não é estar ligado a nada, é só um estado de espírito mais leve, desapegado, e que vê a vida de uma forma mais prazerosa, humorada e que dá mais valôr às amizades e que se iniciou naquele período com um 'quê' especial.
"Não é o lugar em que nos encontramos nem as exterioridades que tornam as pessoas felizes; a felicidade provém do íntimo, daquilo que o ser humano sente dentro de si mesmo' Roselis von Sass - www.graal.org.br
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