LONGE, MUITO LONGE
Supreendo-me ao rever uma foto que nem lembrava mais. Ali estou eu numa das muradas de San Marino e abaixo la pianura um tanto sem relevo da Emilia-Romagna, terra que amo. Lembro daquele domingo. Estou prestes a deixar a Itália e conhecer San Marino foi uma espécie de dolorida despedida. A foto flagrou minha tristeza.
Mês de maio límpido, o ápice do Monte Titano, turistas subindo caminhos medievais. A república mais antiga do mundo, apesar do nome pomposo, é só isso: um monte que se eleva, um museu de armas, três ou quatro fortalezas e umas casinhas miúdas. Em época remota, San Marino emitia moedas próprias, e os seus selos já eram cobiçados por filatelistas.
Enfim. Descemos o Monte Titano de volta a Rimini. Às vezes nascemos em determinado país, mas nossa alma não obedece, está geograficamente longe. Em Rimini encontrei-me como ser humano. Lá eu re-nasci. A Viale Americo Vespucci presenciou minhas caminhadas apressadas, o rio Marecchia escutou conversas bobas de um coração apaixonado. Capuccino com torta de maçã do bar da Via Triste. As deliciosas piadinas – com rucula e prosciutto - na Piazza Tre Martiri. A garrafa enorme do Trebbiano di Romagna comprada no supermercado.
Nas vitrines do Corso d´Augusto meu rosto branco às vezes brilhava mais que o vidro, a felicidade cintila. Na Chiesa di San Girolamo acendi velas para os mortos queridos. Ri muito quando vi que não eram velas de verdade, eram bastonetes que se acendiam com interruptores. Meus amados lá em cima estariam rindo também?
Olho para a foto já meio sem cor. O rapaz triste. O Monte Titano que estará sempre perto do céu. Os selos do museu não servem mais para enviar cartas e postais. Mais uma paisagem passou por mim.
Tudo parece estar longe, sem palavras para medir a distância.