Não da para acreditar
 
Já no fim da manhã fui até minha casa buscar alguma coisa esquecida e  agora não lembrada. Não lembrada agora porque no dia eu sabia o que era e já estava de saída quando minha mãe chamou-me. Queria que eu a ajudasse a conferir uma conta e quando isso acontece o tempo passa porque nunca estamos de acordo apesar de chegarmos ao mesmo resultado. Nossos caminhos de raciocínio são diferentes e por isso já considerava a perdição do resto da manhã e não deu outra.
 
Minha mãe tem oitenta e sete anos e é a dona da casa. Fran trabalha conosco e vai ao supermercado diariamente. E minha mãe confere tudo, tim tim por tim tim. Fiquei apreensiva quando soube o que ela queria conferir porque estávamos na sala de jantar e Fran na cozinha ouvindo tudo. Mas não era nada disso. Após contarmos e recontarmos o troco, parte em moedas, um sem números de vezes, chegamos ao mesmo resultado –  devolver. E lá fui eu para o Supermercado, bem orientada pela Fran, a procura da autora de tão grave delito. E eu lhe devolvi o dinheiro e ela ficou feliz e grata porque essa merreca seria descontada do seu salário.  O dinheiro não era meu, nem de minha mãe,  nem da mocinha que trabalha como caixa. O dinheiro era do dono do Supermercado e por mais merreca que fosse precisava ser devolvido. Porque segundo minha mãe. O que é meu é meu, o que é seu é seu. Cresci ouvindo isso e está mais que aprendido, impossível desaprender.
 
Tenho um amigo, que era virtual, mas que hoje é real, que me disse um dia, comentando um texto meu: Ainda vou fazer você parar de ler Veja. Ninguém nunca vai me fazer parar de ler Veja e eu não compreendo porque certas alas da intelectualidade têm essa implicância com a Revista. Acho que li todos os números de Veja que foram publicados embora em alguns eu tenha apenas passado uma vista d’ olhos. O vício de ler acaba nos transformando em leitores dinâmicos – basta uma olhadinha e tudo é assimilado. Pois como eu ia dizendo, tem coisa que a gente aprende que não tem mais jeito de desaprender. Meus pais foram os meus melhores professores para questões relacionadas a princípios e valores e essa Revista nunca esteve em desacordo com as coisas que aprendi com eles.
 
Ultimamente a Revista está empenhada em uma luta sem tréguas. Não dá para descansar um só número porque o bom combate precisa continuar. O bom combate atualmente é o combate à corrupção que no Brasil se tornou meio de vida para alguns. E olhe, não são merrecas que estão sendo roubadas – são bilhões. A lei do que é meu é meu o que é seu é seu não vigora, no mundo onde tudo é meu, porque tenho direitos – somos cidadãos de primeira classe, especiais, como já disse certo ex-presidente sobre outro.
 
Eu fiquei pensando nisso desde ontem. Como é que os corruptos criam seus filhos? Eles abrem o jogo desde cedo e ensinam os seus valores? Eles dizem aos filhos – nós pegamos o dinheiro do povo para nosso benefício porque nós somos melhores do que eles, que são bobinhos e não dão conta de cuidarem de si mesmos? Ou fingem que não fazem nada de errado, ou são adeptos do façam o que falo, mas nunca o que faço? Provavelmente só poderiam dizer – sigam o exemplo do papai que vocês vão se dar bem na vida. Mas quando se estrubicam só lamentam o terem sido tolos e se deixado pegar.