RECEITA PRA SE TIRAR LEITE DE PEDRA
Hoje cedo fui tomada de súbito por uma sensação curiosa. Já a conhecia de longe... Um amigo, que é mágico na arte das letras, me contou – ele nem sabe, mas contou. Aconteceu exatamente como ele disse, mesmo sem saber, uma ideia nunca chega até uma cabeça germinal sem causar um latejamento ofuscante e ensurdecedor. Foi assim que se deu: Trabalho e TUM-TUM, respiro e TUM-TUM, converso e TUM-TUM... É ela, como disse o meu amigo, querendo sair. Nesse caso, não há o que se possa fazer, o jeito é deixar a bichinha saltar e PLAFT! Brotar no papel.
Então é isso, cá estou, caneta na mão, inspiração a transcender...
Antes de mais nada, é necessário falar de pedra. Não de uma pedra qualquer, falo de um fragmento de rocha metido a besta, daqueles que um dia se pôs no meio do caminho do poeta e de tão impertinente ganhou o mundo, tornou-se “leite”! Estas pedras são as minhas preferidas: costumam ter cara de... Pedra mesmo... Rachaduras de pedra, textura de pedra, entrâncias de pedra... O leitor pode estar pensando disso ser caso sem importância ou conversa de maluco, mas não é não, senhor. Ora, elas compõem, com outros elementos as camadas do solo, surgiram junto com o mundo...Enfim, não precisa dizer mais nada. São importantes e acabou!
Bem, há de se considerar que tirar leite de pedra é algo como “procurar cabelo em ovo” ou “ver chifre em cabeça de cavalo”, coisa difícil, beirando o inacreditável. Mas o legal do inacreditável é que, tem gente, como um cara Dalí, sujeito pra lá de surreal que fez dele (do inacreditável), as coisas mais belas pra se ver na vida. Sendo assim, vá lá... Quem irá duvidar que se pode tirar algo de pedra que não seja outro fragmentozinho...Ninguém duvide, tiraremos leite!
Como boa professora que sou, sei bem que uma receita não pode ser essa coisa desorganizada: palavras atropelando pensamento e pensamento atropelando palavras. Não é assim, não. Ela tem que estar e s m i u ç a d i n h a, f a t i a d a em partes para que o leitor compreenda e possa materializá-la. Como não quero que nenhuma pedra desande por conta da desarrumação das minhas ideias, vou explicar tudinho como se faz a tal da alquimia. E o senhor, preste muita atenção!
INGREDIENTES:
1 pedra bem dura mesmo
1 xícara gigante de pensamento positivo (sem ele nem tente!)
½ quilo de paciência (talvez 1000)
2 conchas transbordando de firmeza
1 pitada de insanidade (não exagere, para não ser taxado de louco!)
½ xícara gigante de cuidado
½ xícara gigante de dedicação
2 pás de pedreiro de criatividade
1 tonelada (ou duas) de amor (pra regar o tempo inteirinho!)
MODO DE FAZER
Coloque a pedra em um refratário bem grande, apropriado para agüentar a rudeza dela. Aos poucos (poucos mesmo, esta não é uma receita que se faça da noite para o dia...) vá acrescentando o pensamento positivo, a paciência e a firmeza. A pitada de insanidade o senhor pode deixar à parte, para os momentos de dsespero. Misture sempre, para homogeneizar, dar liga, entendeu? Coloque o cuidado com muito cuidado (não queremos pecar por excesso ou falta de zelo), a dedicação e a criatividade à vontade. A mistura tem que ser regada a todo instante com amor.
TEMPO DE PREPARO
Às vezes, o curto espaço de uma vida inteira. Mas depois de feito, nada há de mais precioso. O produto final dá uma sensação de conforto e orgulho: o criador e a criatura!
Então, pronto. A receita está postada, dita e feita, como imaginei. Tirei-a de uns manuaizinhos de sabedoria guardados na cachola e herdados de minha avó. Faço-a todos os dias para não perder a prática e, de quando em quando, eis que surge um leitinho respingando daqui e dali. Confesso ao senhor, e não minto, que já vi até refratário transbordar!