Deixando pra lá
 

Na capa, o rosto de um homem enraivecido, que já perdeu a paciência e não aguenta mais. Dentro da revista uma reportagem sobre as leis absurdas que infernizam nossa vida. É a Revista Veja desta semana.

Leis absurdas não é privilégio brasileiro. Outras partes do mundo também as têm. Mas aqui, além de serem absurdas, as leis ora funcionam, ora não. Para funcionar a lei tem que pegar. Se não pegou, é ignorada. Nunca são fiscalizadas por isso há uma baderna geral. Faz parte de nossa cultura.

Resolvi também escrever sobre o assunto, não para polemizar ou levar aos leitores outras leis absurdas que não foram levantadas pela revista. Vou é contar a minha experiência com uma dessas leis.

A Resolução 168 do CONTRAN, em vigor desde 2004, determinou que todos os motoristas habilitados antes de 1998 deveriam fazer um exame teórico de direção defensiva e primeiros socorros. Como era o meu caso, ano passado procurei uma autoescola para me matricular, a mais próxima de minha casa. Cheguei lá no horário certo e me informaram que eu teria que comprovar minha presença através de impressões digitais, na entrada e na saída de cada aula, enviadas on line para o DETRAN. Entrei na fila e fiz o que era solicitado. Primeira da fila fui me assentar em uma das primeiras carteiras, com meu livrinho sobre o Trânsito e meu lápis apontado, para   esperar a aula começar.

Foi aí que tive a grande surpresa: ninguém mais se assentou, as pessoas assinavam digitalmente e iam saindo, normalmente. Só eu fiquei e o professor deu aula só para mim. Não lhe perguntei nada, certos mistérios gosto de decifrar sozinha. Decifrei logo: com a aula chegando ao fim as pessoas foram voltando e já formando fila para assinar digitalmente a saída.

E assim foi em todas as aulas que assisti. Nem todas as aulas eu estava sozinha, tenho que confessar. De vez em quando um mais preguiçoso ficava por ali conversando comigo e com o instrutor. E aqueles que iniciavam o curso também permaneciam na sala, já que o curso era contínuo e as aulas dadas fora de uma ordem lógica, mas tão logo descobriam o jeitinho, entravam e saiam com a mesma desenvoltura. E nem pensem que eu ficava até o fim da aula porque sou Caxias, ou CDF, ou qualquer outro nome que costumam dar a quem cumpre o dever. Eu apenas achava ridículo entrar e sair para dar uma voltinha e fazer nada em poucos minutos. Ficava ali por comodismo. E mais, vou confessar: não precisei fazer prova nenhuma, a autoescola se encarregava de tudo. Até que gostei da lei do menor esforço. E é aqui que comprovei a posteriori, já que eu nunca tinha pensado no assunto, sobre a tese de Lobo Antunes de que com o tempo passamos a confundir atitudes menores, como resignação e desinteresse, com sabedoria e paciência. Se fosse em outros tempos menos resignados e mais impacientes eu teria posto a boca no trombone e armado um grande auê. Mas sentindo que não valeria a pena fazer confusão só por conta do dinheiro e tempo perdidos acabei deixando para lá.