O LADO PRÁTICO DA VIDA COMO ELA É.
Por Carlos Sena
Não tenho dúvidas acerca de que na vida, nada é por acaso. O princípio disto pode ser espiritual dependendo da crença de cada um, mas também pode ser de natureza prática. Dispor desses dois elementos conjugados, certamente contribui muito para que tenhamos menos angústias diante de acontecimentos que a vida nos dá e que, geralmente, não temos condições de compreender com a propriedade que gostaríamos. A religião é importante. Ser prático é igualmente importante. Contudo nenhuma das alternativas nos garante substratos suficientes para contextualizarmos, por exemplo, a morte de um ente querido. Por um lado é importante a fé, mas esta dificilmente se edifica sozinha, por osmose – carece de estrutura e é aqui que a religião se estabelece. O perigo está no fato de que várias igrejas, especialmente as pentecostais, mais alienam as pessoas do que as liberta. O lado prático diz sim, mas a vida parece dizer não, pois diante do que a vida nos faculta as múltiplas escolhas não se submetem ao “X” na resposta certa. Entre o que a religião prega e o que os seus pastores, padres, etc., dizem, não raro ficam um fosso de incoerência muito grande. Nesse viés, as pessoas precisam continuar vivendo e encontrando formas particulares de administrar seus sentimentos em função do que a vida vai lhe proporcionando sob formas diversas.
A difícil construção está na forma de “desconstrução”. Na maioria das vezes temos que nos reprocessar por dentro para poder descobrir alternativas de convivência saudável entre o que acreditamos e o que a religião nos disse pra acreditar; entre o que nossa família nos disse como certo e a vida nos mostra que estavam errados; entre o sentido filosófico da vida e o sentido prático da existência. Essa reconstrução pode muito bem ser calcada sem que se tenha que romper com algumas estruturas que nos cercam, como a religiosa. A nossa liberação interior pode acontecer independente dos dogmas estabelecidos, pois se não formos práticos a vida passa depressa e não se alcança um nível de liberdade particular. Esta se firma, basicamente, no estabelecimento de nossa práxis que por sua vez se adéqua no que for possível às práxis alheias. Essa “revolução” do nosso interior talvez seja a única capaz de nos levar ao nosso próprio encontro sem deixar de nos encontrar com os outros. O grande mérito talvez seja o não confronto. Quando a gente se confronta permanentemente com o que nos contraria, certamente aceleramos a velhice e estimulamos as doenças cárdio vasculares. Contudo, nenhuma revolução se faz de fora pra dentro, exceto a dos outros. A nossa própria não se faz por osmose, mas com alguma base filosófica do mundo e da vida. Nesse entremeio, vida e morte, noite e dia, branco e preto, alto e baixo, chuva e sol, homem e mulher, velho e moço, passam a ser visto além da dicotomia do óbvio. Esse “além da dicotomia do óbvio” se estabelece, inclusive com base religiosa no sentido mais libertador da palavra e com fundamentos culturais. Não basta ter religião, mas estudá-la. Não basta ser culto, mas cultuá-lo na prática.
Entender que tudo tem sentido e nada é obra do acaso é se permitir a compreender certos mistérios em vida. Mistérios que precisamos morrer pra compreendê-los, não servem para nossa felicidade prática de uma vida tão passageira. Quem está vivo um dia vai morrer e disto ninguém duvida. Portanto, é bem melhor que procuremos ser felizes na realidade concreta porque um dia teremos que partir e pode ser sejamos pegos querendo entender o sexo dos anjos, sem que estes estejam interessados nisto.
A vida pautada num contexto espiritual nos ajuda muito na compreensão de que tudo nela tem seu tempo. O mistério está em que nem sempre nosso tempo é o tempo dos acontecimentos e, neste caso, melhor esperar o momento em que os dois momentos se combinam para acontecer. Sendo prático 1: nada mais prático do que uma boa teoria. Sendo prático 2: todo mundo quer ir pro céu, mas ninguém quer morrer; não se faz omelete sem quebrar os ovos... A vida, como tudo tem seu preço.